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Dono do santander e do real, emilio botín quer captar US$ 5 bilhões no brasil

Um filme em três dimensões inicia os visitantes do Espaço Bovespa no emocionante mundo da bolsa de valores, no centro antigo de São Paulo. O ambiente já foi palco de muito corre-corre de operadores e, hoje, é usado para a educação financeira de aspirantes a investidores e para as cerimônias solenes de lançamentos de ações.

Essas festas andaram escassas nos últimos meses por causa da crise financeira global, mas prometem voltar com a animação habitual neste segundo semestre. Várias companhias aproveitaram o recente bom humor dos mercados e a alta dos preços na BM&FBovespa para preparar lançamentos de ações, desde novatas com ofertas públicas iniciais (IPO, em inglês) até veteranas com sede de capital. Se você já assistiu a esse filme, reprisado incansavelmente desde 2004, deve estar pensando se vale a pena comprar ingresso e pipoca. Talvez sim, talvez não. Só uma coisa é certa: sorrisos e lágrimas, gritos e suspiros estão a caminho.

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Desde março, oito empresas levantaram R$ 20,5 bilhões na bolsa. A maior operação foi a da Visanet, de R$ 8,4 bilhões. Natura, Light, Perdigão, Hypermarcas, BR Malls, MRV Engenharia e Redecard captaram o restante e abriram caminho para a segunda leva. Animados com a aproximação do Ibovespa na casa dos 60 mil pontos e a queda das taxas de juros, novos atores entraram na fila do pregão. Nomes como Banco Santander Brasil, Cetip, Direcional Engenharia, Tivit e Brazilian Finance & Real Estate fizeram fila no casting da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que decide quem pode e quem não pode vender ações ao público. Também voltaram à sala de projeções da BM&FBovespa veteranos como Gol , Multiplan, PDG Realty, Rossi Residencial e Brookfield (veja tabela na pág. 115).

De todos, o candidato a maior blockbuster é o banco espanhol Santander, que no Brasil também é dono do Banco Real e está unificando as operações. O banqueiro Emilio Botín e seu fiel escudeiro, o presidente Fábio Barbosa, querem reforçar o capital da filial brasileira para investir mais e competir de igual para igual com os maiores concorrentes de varejo, o Banco do Brasil, o Itaú Unibanco e o Bradesco. Botín nunca escondeu suas ambições de construir “o primeiro banco privado do Brasil”. Barbosa, mais pé no chão, fala em transformar a franquia no “melhor banco do Brasil”.

Com 150 anos de história na Espanha, presença em 40 países, 80 milhões de clientes e 2,3 milhões de acionistas, o Santander quer vender na bolsa cerca de 15% da filial brasileira, sua principal fonte de receitas na América Latina. Terceiro maior banco privado do País, o Santander Brasil tem ativos de R$ 315 bilhões, depósitos de R$ 122 bilhões, empréstimos de R$ 137 bilhões e 3.612 agências, a maior parte concentrada nas regiões Sul e Sudeste. Os números da operação não foram confirmados, mas prometem ser superlativos. Segundo relatos da imprensa americana e inglesa, o IPO do Santander poderia alcançar US$ 5,6 bilhões, ou mais de R$ 10 bilhões, superando o da Visanet. No mundo todo, somente um IPO foi maior este ano, o da China State Construction Engeneering Corp, de US$ 7,3 bilhões, em julho.

Enquanto você lê esta reportagem, investidores estrangeiros e brasileiros fazem contas para decidir se vão ou não arriscar dinheiro nas próximas emissões de ações. Ricardo Torres, professor de Finanças da Brazilian Business School e dono do clube de investimentos Arcádia, é um deles. Como já trabalhou em bancos internacionais e é especialista no assunto, Torres pretende investir no Santander. “A atividade bancária é uma das mais lucrativas no Brasil e o Santander é um banco percebido como agressivo e bem-sucedido”, afirma. “O pessoal riu dos espanhóis quando compraram o Banespa por R$ 7 bilhões, mas eles conquistaram uma fatia importante do mercado e ganharam dinheiro de braçada depois disso.” Torres, no entanto, recomenda muita cautela aos investidores individuais atraídos pelas novas operações neste fim de ano.

Sua lógica é a seguinte: os empresários só vendem ações das empresas quando a bolsa está em alta, como agora. Se os preços estão no pico, o risco de queda é maior. “O pequeno investidor não deve acreditar em tudo o que ouve”, insiste. É melhor ir com calma e mergulhar nos números das empresas e dos setores antes de fazer a reserva das ações.

 

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A Gol de Constantino Júnior volta à bolsa e encontra a Cetip e a multiplan na fila

As empresas do setor imobiliário, por exemplo, merecem cautela redobrada nas análises. No último ano, o setor passou por um período forte de turbulência e consolidação, no qual empresas em dificuldades foram incorporadas por outras mais fortes, como é o caso da Inpar, Abyara e Klabin Segall. As que sobreviveram querem se capitalizar. “As empresas do setor imobiliário querem voltar à bolsa para aumentar o capital de giro. Com exceção da PDG Realty, cuja emissão pode estar ligada à compra de uma construtora no Nordeste, as demais precisam se capitalizar para crescer”, explica Silvio Araújo, analista do setor imobiliário da corretora Lopes Filho.

Analistas recomendam muita cautela aos investidores atraídos pelas estreias e reprises

Segundo ele, a perspectiva de crescimento para as empresas do setor está em torno de 40% para este ano e o mercado parece acompanhar essa ânsia de expansão. “O Brasil tem um mercado espetacular. A demanda por ativos imobiliários é muito grande, sobretudo nas classes mais populares.

E há uma perspectiva de que essa demanda cresça de forma explosiva nos próximos anos. Se os juros do crédito fossem menores, seria uma explosão absurda”, diz.

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Entre as seis companhias do setor que voltam à bolsa em 2009, Araújo destaca a MRV e a PDG Realty. “São empresas saudáveis e têm apresentado resultados estáveis, mesmo durante a crise”, afirma. A MRV perdeu 74% de seu valor em 2008. Desde janeiro, suas ações se valorizaram 256,9%. Na PDG Realty, o desempenho foi semelhante. Quase 54% de perdas em 2008 contra 143% de alta até 8 de setembro de 2009. Já a Rossi Residencial perdeu 83,2% em 2008 e depois subiu 235,4%.

Apesar da arrancada, não é uma boa escolha, na opinião de Araújo. “Eu não indico. Ela é a única do setor que abriu capital em 1997. E quem comprou a ação no IPO, há 12 anos, ainda está perdendo. Um papel com desempenho muito ruim no longo prazo não é bom”, diz. A ação da empresa acumula queda nominal de 5,3% no período.

O auxílio do governo às construtoras, tanto com o Pacote da Construção Civil como com o programa Minha Casa, Minha Vida, foi uma forma de impulsionar o crescimento no primeiro semestre. Todas as empresas do setor que voltaram a emitir ações em 2009 se beneficiaram, de alguma forma, por esses programas. No entanto, os resultados ainda não podem ser notados. Segundo a Caixa Econômica Federal, apenas 34 mil imóveis começaram a ser construídos, uma fração do um milhão de casas previstas pelo governo.

Ações de construtoras recuperam perdas fortes de 2008, mas nem todas são boa opção

O investidor interessado deve ter paciência e ficar atento às características do setor. O ciclo de produção de uma construtora é longo. Ela compra o terreno, começa a construir e tem que vender. Demora cerca de três anos até aparecer o lucro no balanço. Somente agora começam a surgir os lucros da expansão imobiliária de 2006 e 2007. No caso das empresas de shopping centers, como BRMalls e Multiplan, as perspectivas também são de crescimento. O principal motivo é a demanda de lojistas por espaço, como consequência do reaquecimento do varejo.

Com tantas opções no horizonte, o investidor precisa tomar cuidado para não presenciar mais um déjà vu. Se o boom das imobiliárias ocorrido em 2007 se repete hoje em emissões, pode também se voltar na forma de resultados negativos. Segundo Silvio Araújo, a fase de consolidação não terminou e algumas empresas podem sofrer perdas graves. “Ainda há os que não estão saudáveis nesse mercado. Deve vir uma segunda onda de incorporação de empresas que possuem problemas estruturais e podem ficar para trás”, diz. Para não sintonizar esse canal de perdas, o investidor deve ficar atento.

Analisar o preço do ativo, o prospecto da emissão e o balanço da empresa é o primeiro passo. Mas como avaliar o valor de um papel não é tarefa para leigos, procurar pessoas capacitadas para fazê-lo pode ser a solução. “É preciso procurar especialistas que precifiquem o papel e digam se o valor no IPO está barato ou não”, afirma o analista da Lopes Filho. A rentabilidade no curto prazo não deve ser parâmetro de escolha.

Comparar os resultados das empresas do setor, a evolução das margens, o retorno sobre os investimentos e o desempenho no longo prazo é a principal dica para quem não quer assistir a um filme ruim e repetido nessa nova temporada de lançamentos na BM&FBovespa.

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