10/11/2024 - 12:00
Quando Donald Trump chegou à Casa Branca pela primeira vez há oito anos, líderes chineses agitados reagiram com força às suas tarifas e à sua retórica inflamada, resultando em uma guerra comercial que fez com que os laços entre as maiores economias do mundo caíssem para os mais baixos níveis em vários anos.
Desta vez, Pequim tem se preparado para o retorno de Trump, aprofundando laços com aliados, aumentando a autossuficiência em tecnologia e reservando dinheiro para sustentar a economia, que agora está mais vulnerável a novas tarifas, as quais Trump já ameaçou impor.
Embora alguma retaliação a essas medidas possa ser inevitável, a China se concentrará em explorar brechas entre os Estados Unidos e seus aliados, dizem os especialistas, e buscará baixar a temperatura para ajudar a fechar um acordo antecipado para amortecer o impacto do atrito comercial.
Zhao Minghao, especialista em relações internacionais da Universidade Fudan, de Xangai, disse que a China provavelmente não repetirá o manual do primeiro mandato de Trump, quando Pequim teve uma reação muito forte às suas medidas tarifárias.
Ele destacou a mensagem do presidente da China, Xi Jinping, para Trump na quinta-feira, na qual Xi pediu “cooperação” e não “confronto”, enfatizando relações “estáveis, sólidas e sustentáveis” entre as duas superpotências.
“Trump não é um estranho para Pequim neste momento”, disse Zhao à Reuters. “Pequim responderia de forma ponderada e se esforçaria para se comunicar com a equipe de Trump.”
Embora os gigantes chineses da tecnologia sejam agora muito menos dependentes das importações dos EUA, a economia — atingida por uma enorme crise imobiliária e sobrecarregada com dívidas insustentáveis — está em uma posição mais fraca do que em 2016, sofrendo para arrancar um crescimento de 5% em comparação com os 6,7% daquela época.
Para piorar a situação, Trump prometeu acabar com o status de nação comercial mais favorecida da China e aplicar tarifas sobre as importações chinesas superiores a 60% — muito mais altas do que as impostas durante seu primeiro mandato.
Zhao, da Fudan, disse que Pequim tem esse cenário em mente, mas espera que as tarifas fiquem abaixo do nível prometido na campanha, porque “isso aumentaria significativamente a inflação nos EUA”.
Ainda assim, essa ameaça, por si só, enervou os produtores da maior exportadora do mundo porque a China vende mercadorias no valor de mais de 400 bilhões de dólares por ano para os EUA e centenas de bilhões a mais em peças para produtos que os norte-americanos compram em outros lugares.
Li Mingjiang, um acadêmico da Escola de Estudos Internacionais de Rajaratnam em Cingapura, disse que, como resultado, a economia chinesa pode precisar de um estímulo ainda maior do que os 1,4 trilhão de dólares esperados nesta sexta-feira.
“Será um golpe muito sério para o comércio internacional da China que afetará os empregos e as receitas do governo”, disse Li. “A China provavelmente terá que apresentar um pacote de estímulo muito maior internamente.”
Batalha dos chips
O setor de semicondutores da China está se preparando para mais quatro anos de briga com Donald Trump na presidência dos Estados Unidos, aumentando compras de equipamentos de fabricação de chips e buscando oportunidades de contratação de talentos estrangeiros, além de novas alianças.
Entre as estratégias que estão sendo consideradas estão a busca de laços mais estreitos com países e empresas que podem se sentir alienados pelas políticas futuras do presidente-eleito dos EUA e reforço aos esforços de autossuficiência, de acordo com uma análise de artigos publicados por empresas chinesas de chips, associações e analistas nesta semana após a vitória de Trump.
O futuro presidente dos EUA perseguiu os conglomerados de telecomunicações chineses
e ZTE, bem como a fabricante de chips SMIC, durante seu primeiro mandato, colocando-os em listas negras de comércio que restringiram acesso a hardware e software desenvolvido nos EUA.
O governo de Joe Biden, por outro lado, tem se apoiado em amplos controles de exportação, com o objetivo de impedir que a China tenha acesso a chips mais avançados fabricados por empresas norte-americanas.
Zhu Jing, vice-secretário-geral da Associação da Indústria de Semicondutores de Pequim, pediu na quinta-feira às empresas chinesas de chips que reforcem seus negócios no exterior e se expandam para mais países, dizendo que pode haver oportunidades para retomar a aquisição de certas importações de chips caso a coordenação entre EUA, Japão e Europa para mais sanções contra a China enfraqueça sob Trump.
As empresas também devem se esforçar para atrair talentos estrangeiros se o governo Trump repetir a postura de seu primeiro mandato e implementar políticas que dificultem o trabalho de estudantes e profissionais chineses nos Estados Unidos, disse ele em um artigo publicado no WeChat.
“Depois que Trump assumir o cargo, é possível que haja alguns benefícios para o desenvolvimento do setor de semicondutores da China em termos de talentos profissionais, empresas multinacionais e cooperação estrangeira. Recomendo que nos adaptemos à nova situação e às mudanças em tempo hábil”, disse ele.
Muitos dos artigos também previram que o setor verá um aumento nos controles de exportação e possíveis tarifas contra ele sob Trump e que dobrar a autossuficiência é o caminho a seguir.
“O primeiro mandato de Trump nos fez perceber a importância dos semicondutores e a necessidade de localização, abrindo caminho para que o setor de chips da China se torne autossuficiente”, disse a Jinan Lujing Semiconductor Co, fabricante de microprocessadores de segurança usados em dispositivos de energia, em sua conta no WeChat.
Preparados
A China aumentou compras de equipamentos de produção de chips do exterior. Nos primeiros nove meses deste ano, as importações chinesas dessas máquinas aumentaram 30%, chegando a 24,12 bilhões de dólares, de acordo com dados do país.
Desse total, 7,9 bilhões de dólares foram gastos em máquinas de litografia, que são necessárias na fabricação dos chips mais avançados, um aumento de 35,44% em relação ao ano anterior.
A maioria (7 bilhões de dólares) desses equipamentos veio da Holanda. A ASML parou de enviar suas máquinas de litografia ultravioleta profunda (DUV) mais avançadas para a China este ano e, em alguns casos, modelos DUV mais antigos para determinadas fábricas, seguindo as regras estabelecidas pelo governo Biden no ano passado. A empresa não consegue enviar suas máquinas de litografia ultravioleta extrema (EUV) para o país desde 2019.
Duas fontes do setor disseram à Reuters que as empresas chinesas estavam maximizando os pedidos de equipamentos de semicondutores para se protegerem de qualquer impacto eleitoral.
“As empresas chinesas de tecnologia, que sofreram o impacto das tarifas durante o primeiro governo Trump, expandiram progressivamente suas capacidades de produção para mitigar riscos futuros”, disse Nori Chiou, diretor de investimentos da White Oak Capital Partners, com sede em Cingapura.
“Elas estão mais preparadas desta vez e se sentem mais prontas do que com a guerra comercial de 2018 e a eleição de 2020.”