17/01/2011 - 5:39
A inesperada volta ao Haiti na noite de domingo do ex-ditador Jean-Claude “Baby Doc” Duvalier aumenta a incerteza política vivida por um país já em crise depois das questionadas eleições presidenciais.
Duvalier chegou acompanhado de sua esposa, Veronique Roy, e foi recebido por uma delegação de ex-funcionário que serviram em seu gabinete de ministros, enquanto dezenas de seguidores se reuniram do lado de fora do complexo.
Veronique Roy disse à AFP que seu marido se colocou de joelhos e beijou o solo ao pisar em sua terra natal pela primeira vez desde sua deposição em 1986.
“Haiti, meu país, o país de Dessalines”, contou Roy, citando Duvalier, que se referiu ao herói da Independência Jean-Jacques Dessalines, que expulsou os franceses e se converteu em imperador.
Roy sugeriu que a volta do casal foi motivada pelo devastador terremoto que, há exatamente um ano, causou a morte de quase 250 mil haitianos. “Esse foi o fator motivador”, afirmou ela. “É tão emotivo, não esperávamos esta recepção”, acrescentou.
Com 59 anos, o ex-ditador, apelidado “Baby Doc”, vivia no exílio na França.
Da parte do governo haitiano, a notícia dessa volta despertou uma reação moderada.
O primeiro-ministro haitiano Jean-Max Bellerive disse à AFP que Jean-Claude Duvalier tem o direito de regressar a seu país.
“Duvalier é um cidadão haitiano que regressa a seu país como tem direito. Só espero que isso não complique uma situação que já é tensa”, declarou.
Em 2007, Jean-Claude Duvalier falou às rádios haitianas para pedir “perdão ao povo pelos erros cometidos” durante seu governo.
O presidente René Preval reagiu dizendo que se havia perdão, também havia justiça, pois o ex-ditador é acusado por desvio de fundos no exercício do poder.
As autoridades do Haiti consideram que mais de 100 milhões de dólares foram desviados sob o pretexto de obras sociais até a queda, em 1986, de “Baby Doc”, que sucedeu, em 1971, seu pai François Duvalier, eleito presidente por via democrática em 1957.
A França aceitou em 1986 receber Jean-Claude Duvalier quando ele passou a enfrentar, desde o final de novembro de 1985, manifestações antigovernamentais nas quais morreram dezenas de haitianos.
Como aconteceu com o presidente Jean Bertrand Aristide em 2004, “Baby Doc” foi obrigado pelos Estados Unidos a renunciar e abandonar o país em 7 de fevereiro de 1986 a bordo de um avião da Força Aérea americana.
Jean Bertrand Aristide vive no exílio na África do Sul.
A saída de Jean-Claude Duvalier pôs fim ao regime duvalierista, surgido 28 anos antes com a chegada ao poder de François Duvalier, o “Papa Doc”, a quem sucedeu em 1971 aos 19 anos, virando depois “presidente vitalício”.
Depois que teve rejeitado seu pedido de asilo pela Suíça, Espanha, Grécia, Marrocos e Gabão, viajou finalmente para a França, que o recebeu inicialmente em caráter temporário.
“O ex-presidente do Haiti foi recebido apenas porque isso facilitava libertar o país da ditadura”, disse na ocasião o primeiro-ministro francês Laurent Fabius.
O ex-presidente viveu depois um exílio em amplas mansões na Côte d’Azur francesa.
O regresso não previsto de Duvalier acontece quando o Haiti acaba de completar o primeiro aniversário do terremoto que o devastou e está mergulhado num bloqueio político três semanas antes do fim de mandato de René Preval.
O segundo turno das eleições presidenciais e legislativas previstas para este domingo no Haiti foi adiado, segundo informou o Conselho Eleitoral Provisório (CEP).
“O dia 16 de janeiro constava do planejamento do calendário eleitoral. No entanto, na medida em que os resultados definitivos do primeiro turno ainda não foram proclamados, a data não será respeitada”, declarou à AFP o diretor-geral do CEP, Pierre-Louis Opont.
O anúncio em dezembro dos resultados preliminares do primeiro turno, pelo Conselho Eleitoral Provisório, havia sido motivo de violentas manifestações dos partidários de Michel Martelly, que denunciaram fraude em massa em favor do candidato governista Jude Célestin, que terminou em segundo lugar.
Ganhou o primeiro turno uma ex-primeira-dama, Mirlande Manigat, com 31% dos votos. Martelly foi o terceiro com 7.000 votos a menos que Célestin.
Um grupo de 12 candidatos à presidência exigiu por sua vez a anulação das eleições de 28 de novembro, manchadas, segundo eles, de fraude em favor de Célestin.
cre/cn