As redes sociais desempenham um papel fundamental na vida dos brasileiros, funcionando como plataformas de expressão, informação e conexão. Entre elas, o X (antigo Twitter), que durante muitos anos foi a queridinha dos brasileiros ao oferecer espaço para debates públicos e notícias em tempo real, mas foi transformado em um celeiro de preconceito, discursos de ódio e negacionismo, principalmente após a compra da plataforma pelo bilionário Elon Musk. Com esse cenário, muitos usuários foram processadas, posts tiveram de ser apagados e contas excluídas dos por decisão judicial.

Algumas dessas decisões, no entanto, não estavam sendo cumpridas pelo X. O que levou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes fechar o cerco ao antigo Twitrer, que acusa o juiz de ameaçar prender a representante legal da empresa no Brasil, Raquel de Oliveira Villa Nova Conceição, caso a plataforma não cumprisse as ordens de bloqueio de contas antidemocráticas. Na manhã do dia 17 de agosto, cerca de 40 funcionários do X no Brasil foram surpreendidos com uma reunião on-line de emergência. Foram informados de suas demissões, marcando o encerramento definitivo das atividades do escritório brasileiro.

O ministro do Supremo Alexandre de Moraes (Crédito:REUTERS/Adriano Machado)

No meio do duelo estão funcionários e usuários do X

O perfil oficial do X publicou um comunicado sobre a decisão. “Moraes optou por ameaçar nossa equipe no Brasil em vez de respeitar a lei ou o devido processo legal. Como resultado, para proteger a segurança de nossa equipe, decidimos encerrar nossas operações no Brasil, com efeito imediato. O serviço X continua disponível para a população brasileira”, afirmou a mensagem da rede social, que diminuiu a transparência na divulgação de seus dados. O último balanço público é do segundo trimestre de 2022, quando a receita foi de US$ 1,18 bilhão, com prejuízo de US$ 270 milhões. O que mostra um ceticismo do mercado publicitário em anúncios por lá.

Mas ao sair do Brasil, quais as consequências a partir de agora? Pedro Henrique Ramos, especialista em governança digital, professor do Ibmec e sócio do Baptista Luz Advogados, destacou que o impacto imediato dessa decisão, além das demissões, é o aumento da desinformação e do discurso de ódio na plataforma. “Sem colaboradores locais, fluentes em português e capazes de entender nuances contextuais, a moderação de conteúdo se torna menos eficaz”, avaliou.

Ramos destacou inda que os negócios da Starlink, a empresa de internet via satélite do bilionário, que chegou ao Brasil em fevereiro de 2022, não deve ser afetada. Segundo dados divulgados pela Anatel no início de julho, a Starlink se tornou a maior operadora de internet por satélite no País, mantendo suas operações ativas. “O que se rompeu nessa disputa entre Musk e Moraes foi o elo mais fraco — os funcionários e usuários do X”, disse.

Elon Musk durante conferência de tecnologia em Paris 16/06/2023 (Crédito:REUTERS/Gonzalo Fuentes)

Para Igor Lucena, economista e doutor em relações internacionais pela Universidade de Lisboa, a decisão de Musk prejudica o setor de tecnologia no Brasil. “Quando empresas saem de um país, seja ela de capital aberto ou fechado, isso sinaliza falta de liberdade para investimentos. Investimentos em tecnologia são, muitas vezes, de longo prazo e incertos. É preocupante que o Brasil seja comparado a países onde o X é proibido, como Cuba e China. O X ainda não foi proibido no Brasil, mas já deixou o País”, analisou Lucena.

Disputa

Felipe Fogaça, especialista em tecnologia e fundador da rede social YourClub, vê essa situação como uma queda de braço entre a visão de Elon Musk e o judiciário. “Algumas pessoas apoiam as ações de Musk por ele criticar um juiz que, supostamente, age contra suas preferências políticas”, observou. Fogaça acrescentou que esse impasse não é exclusivo do Brasil, pois Musk tem se envolvido em discussões semelhantes nos EUA e na Europa. Para ele, até o momento, nada muda, já que o X continua sendo usado pelos brasileiros. “Não acredito que saiam do Brasil. Caso isso ocorresse, haveria uma migração em massa para o Threads [do grupo Meta], o que não interessa a Musk”, analisou.