O ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, manteve o afastamento do prefeito de Palmas (TO), Eduardo Siqueira Campos (Podemos), de 65 anos, apontado como o ‘chefe’ de um grupo dedicado ao vazamento sistemático de dados reservados sobre operações sensíveis da Polícia Federal.

Na terça-feira, 8, algumas horas depois de o prefeito sofrer um infarto na Sala de Estado Maior do Comando-Geral da Polícia Militar do Tocantins – onde cumpria prisão preventiva -, Zanin concedeu a Siqueira Campos domiciliar humanitária para que ele possa seguir o tratamento de saúde, mas manteve de pé todas as medidas cautelares antes impostas, inclusive o afastamento do cargo de prefeito.

Siqueira Campos é alvo da Operação Sisamnes – juiz corrupto, segundo a mitologia persa -, investigação que espreita corrupção e venda de sentenças nos tribunais de Justiça de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Tocantins e também em gabinetes de ministros do STJ.

Ele foi preso em 27 de junho, na fase 10 da operação. Diálogos via WhatsApp resgatados pela PF indicam que Siqueira Campos mantinha informantes e aliados, inclusive um advogado e um policial civil, para acessar informações estratégicas de processos em curso no STJ e no Tribunal de Justiça de seu Estado. Ele nega ligação com o suposto esquema de bisbilhotagem.

O prefeito afastado sofreu um infarto na madrugada de terça. Zanin foi informado que Siqueira Campos teve de ser encaminhado ao Hospital Geral de Palmas e submetido a uma intervenção cirúrgica na artéria coronária. Ele está em recuperação.

A defesa do prefeito afastado pretende pleitear o retorno às funções públicas assim que ele for liberado pelos médicos.

Logo após sua prisão, a defesa requereu a concessão de prisão domiciliar, alegando fragilidade no estado de saúde de Siqueira Campos, mas o pedido foi indeferido por Zanin, que acolheu parecer da Procuradoria-Geral da República e manteve o prefeito sob custódia preventiva.

Depois, a PGR pediu que o prefeito afastado fosse avaliado por uma junta médica. No dia 4 de julho, Zanin determinou que os médicos avaliassem a saúde de Siqueira Campos e de outros dois presos da fase 10 da Sisamnes, o policial civil Marco Augusto Velasco Nascimento Albernaz e o advogado Antonio Ianowich Filho – apontados como integrantes do mesmo grupo que atuava no vazamento das decisões.

O ministro considerou que as informações médicas revelaram ‘debilidade’ da saúde do prefeito. Zanin entendeu que o Comando-Geral da PM não possui estrutura adequada para manter o tratamento.

“Dessa maneira, diante desses relatos médicos e da documentação, agora formalizada nos autos, atestando que o Comando-Geral da Polícia Militar de Tocantins não possui estrutura idônea a realizar internamente os exigidos tratamentos, mostra-se razoável e proporcional a substituição da prisão preventiva pelo recolhimento domiciliar”, decidiu o ministro.

Nessa mesma decisão, Zanin reiterou a manutenção de medidas cautelares, inclusive o afastamento de Siqueira Campos da cadeira de prefeito de Palmas, a proibição de contato com os outros investigados e também de sair do país.

Operação Sisamnes

De acordo com a investigação, Siqueira Campos antecipou informações sigilosas sobre operações da PF para aliados. Em uma conversa interceptada, o advogado Antonio Ianowich informou, no dia 13 de novembro de 2024, que haveria o afastamento do governador de Tocantins, Wanderlei Barbosa (Republicanos), alvo da Operação Fames-19, inquérito sobre suposto esquema de desvios de verbas de cestas básicas durante a pandemia da Covid – o chefe do Executivo do Estado nega envolvimento em irregularidades.

‘Oi chefe. Grandes chances de o Gov. ser afastado amanhã’

‘Confirmado o parecer pelo afastamento’

‘É uma fonte minha de Brasília’

‘Disse que a decisão sai em horas’

‘Talvez ainda hoje’

Após ser alertado sobre a chegada de uma equipe da PF a Palmas, Siqueira Campos perguntou por mais detalhes.

‘Vc acha que será amanhã pela manhã?’

‘Quantos homens?’

Ianowich respondeu:

‘São 16 homens’

‘Acho que algo pontual’

Siqueira Campos insistiu:

‘Poderia ser a prece… A pref…’

O advogado: ‘Eles ainda estão em Palmas. Tô tentando descobrir’

A Operação Sisamnes se debruça também sobre suposto esquema de venda de sentenças em pelo menos três tribunais de justiça – Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Tocantins – e em gabinetes de ministros do STJ.

Ascendência na ’empreita criminosa’

Ao determinar a prisão dos investigados, Zanin considerou que a investigação indicou uma atuação “concertada dos investigados para monitorar e obter dados sigilosos” das operações da Polícia Federal que envolvem autoridades do Estado do Tocantins.

“Entendo que os indícios revelados até aqui se qualificam como suficientes para demonstrar o envolvimento dos investigados na empreita criminosa, observando-se a ascendência de José Eduardo de Siqueira Campos sobre os demais, que o qualificam como ‘chefe'”, destacou o ministro.

A decisão considerou que Siqueira Campos, enquanto prefeito, e Marco Albernaz, como investigador da PF, utilizavam suas funções públicas para monitorar até a PF e antecipar operações policiais e, por consequência, atrapalhar as investigações.

“A análise do aparelho celular (de Siqueira Campos) revela compartilhamento de dados sigilosos que poderiam comprometer seriamente o êxito das investigações em curso”, advertiu Zanin no decreto de prisão do prefeito afastado.

Ao pedir a prisão de Siqueira Campos, do advogado e do policial civil, a PF informou que o acesso ao conteúdo do celular do prefeito – agora preso – “descortinou indícios de participação ativa na logística montada para frustrar estrategicamente a efetividade das operações policiais”.

Os investigados pela Operação Sisamnes negam atos ilícitos.

Em nota, divulgada no dia da prisão de Siqueira Campos, a Prefeitura de Palmas informou:

“A Prefeitura de Palmas informa que foi dado cumprimento à decisão judicial em relação ao prefeito Eduardo Siqueira Campos.

Cabe informar à população que as investigações não se relacionam com a atual gestão municipal. A decisão visa à averiguação de informações, e tudo será esclarecido.

O prefeito recebeu a decisão com serenidade e irá colaborar prontamente com os trabalhos. Cabe destacar a abordagem respeitosa dos agentes da Polícia Federal.

Neste momento, é importante prestar todos os esclarecimentos e manter preservada a população de Palmas e a gestão municipal.”