20/07/2019 - 9:31
Foi um salto tão gigantesco que a humanidade não conseguiu suplantá-lo até hoje. Cinquenta anos depois do histórico pouso na Lua, em 20 de julho de 1969, os americanos ainda planejam repetir o passo que garantiu uma vitória política e militar sem precedentes na corrida espacial até então liderada com folga pelos soviéticos. A expectativa é de que em 2024 uma mulher astronauta pise pela primeira vez no satélite. Será o primeiro passo também de um plano de exploração de longo prazo. A humanidade, agora, quer se assentar na Lua e, de lá, ir além: Marte deve ser a próxima parada.
Ao menos esses são os planos da Nasa (agência espacial americana) para o Projeto Artemis (irmã gêmea de Apolo na mitologia grega), já reajustados em alguns anos. Há dez anos, a expectativa era voltar para o satélite em 2019. Mas agora, mais do que nunca, o cenário parece favorável para começar a nova era de exploração. Se há 50 anos colocar um homem na Lua era uma questão de supremacia nacional em meio ao tenso contexto geopolítico da Guerra Fria entre EUA e a antiga União Soviética – em que os esforços e os recursos eram predominantemente governamentais -, agora os trabalhos envolvem parcerias da Nasa com empresas e instituições estrangeiras.
As motivações também são diferentes. Há um claro interesse comercial em ocupar o espaço entre a Terra e a Lua para desenvolver a chamada economia lunar, e os custos para o desenvolvimento de tecnologias estão sendo diluídos entre as muitas partes envolvidas. É o que vem sendo chamado de New Space, em que empresas privadas assumem o protagonismo.
Com o passado fresco na cabeça, porém, é difícil não observar que ainda há um certo clima de competição. Depois que a China conseguiu pousar com uma sonda robótica, no início do ano, no lado mais distante da Lua – o chamado lado oculto, onde os EUA não haviam chegado -, os americanos estabeleceram cronogramas mais justos.
Guerra econômica
Para especialistas, trata-se de um novo tipo de corrida espacial. “A China tem um programa espacial com uma frequência nunca vista antes. É um negócio frenético, estão lançando em torno de três foguetes por mês. Eles têm uma estação espacial só deles, supermoderna, e estão investindo forte na Lua. Hoje estão com um rover no lado mais distante e têm um sistema para se comunicar com ele, o que sempre tinha sido um problema para a Nasa”, comenta o empreendedor espacial Lucas Fonseca, diretor da Garatéa, que deve ser a primeira missão lunar brasileira.
O pesquisador, assim como outros especialistas ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, diz que muita gente do setor desconfia da capacidade da Nasa de cumprir os próprios prazos. Em um congresso sobre jornalismo científico ocorrido no início de julho, na Suíça, essa foi a primeira dúvida que surgiu entre os participantes de um painel sobre o futuro da exploração lunar, mas representantes das agências especiais de China, Europa, Estados Unidos e Rússia se esforçaram para passar a imagem de que o clima agora é de colaboração.
Wu Ji, ex-diretor do Centro Nacional de Ciência Espacial da China, reconheceu que é um desejo dos chineses colocar um ser humano na Lua, mas afirmou que neste momento o foco é a construção da nova estação espacial, prevista para 2022.
“Vai requerer um grande esforço nosso. E, depois que ela estiver pronta, teremos bastante atividade para fazer lá. Se a gente adicionar um pouso na Lua… bem, não é impossível, mas ainda não há uma decisão de mandar astronautas para lá.” Questionado especificamente depois sobre se a primeira mulher na Lua poderia ser chinesa, foi diplomático. “A primeira mulher será dos Estados Unidos.”
Para Lori Garver, ex-administradora da Nasa (2009 a 2013) e chefe executiva da Earthrise Alliance, o momento pede pragmatismo. “Nós fomos para a Lua há 50 anos para bater os russos. Agora as razões pelas quais vamos voltar têm mais a ver com os planos do que queremos fazer na Lua depois. O valor do programa espacial tem de justificar o gasto. Se formos como uma corrida espacial, não teremos colaboração”, disse.
Parcerias
A Nasa tem feito vários acordos com empresas privadas que vão começar a transportar para a superfície lunar instrumentos científicos. A ideia inicial é coletar novos dados para ajudar a definir onde será o pouso futuro, mas depois peças dessas máquinas serão reutilizadas para montar a Gateway – estação espacial que vai ficar na órbita da Lua para servir de suporte para as futuras missões tripuladas e robóticas.
Já para o fim do ano que vem está agendada a decolagem inaugural do Space Launch System (SLS), o maior foguete já projetado e que no futuro próximo vai lançar a cápsula Orion com os astronautas. A estimativa é de que em 2024 aconteça o pouso da Orion. A proposta é descer no polo sul, onde há reservas de água congelada.
“Podemos criar manufatura na Lua para a indústria de pesados, que poderiam ser trabalhados lá com muito mais facilidade por causa da falta de gravidade”, diz Fonseca. Entre as ideias está fazer esses produtos com metais minerados de asteroides. “Do ponto de vista do desenvolvimento sustentável, há justificativa para pensar num aproveitamento de recursos naturais fora do planeta. E assim não mais destruir o que resta da Terra”, defende o pesquisador brasileiro Sidney Nakahodo, presidente da New York Space Alliance. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.