05/06/2021 - 3:34
Quando a profissional da saúde Neelam Kumari bate à porta em uma aldeia indiana, os moradores às vezes fogem com medo de que ela queira vaciná-los contra a covid-19.
Enquanto a onda devastadora de infecções diminui nas cidades indianas, a pandemia mortal está varrendo as zonas rurais empobrecidas do país, onde a ignorância e o medo reinam soberanos.
“Muitas pessoas em minha aldeia não querem ser vacinadas, temem morrer”, diz à AFP Kumari em Dhatrath, um vilarejo com pequenas habitações de dois andares no estado de Haryana, onde búfalos perambulam pelas ruas.
“Um morador ficou tão bravo que bateu em um trabalhador (da saúde) que tentava convencê-lo a receber a vacina”, conta.
Apenas 15% das pessoas nas áreas rurais, em comparação com 30% nas cidades, receberam pelo menos uma dose da vacina na Índia, apesar de dois terços das infecções ocorrerem no campo, de acordo com uma análise do jornal The Hindu.
As mensagens antivacinas se espalham na internet ou em aplicativos como o WhatsApp. Rumores de que a rede 5G causava covid-19 levaram ao ataque de várias torres no estado de Haryana.
“As pessoas nem fazem mais o teste porque acham que o governo vai declarar que são positivas, mesmo que não sejam”, afirma Shoeb Ali, médico da cidade de Miyaganj, no estado de Uttar Pradesh, no nordeste do país.
– Vacinas mortais –
Os temores persistem, apesar do testemunho dos cadáveres das vítimas da covid-19 nos rios e covas rasas.
Na aldeia de Nuran Khera, em Haryana, os habitantes recusam-se a ser vacinados, apesar de reconhecerem que em muitas casas houve casos de febre e sabem de mortes.
“Mesmo depois da abertura do centro de vacinação aqui, ninguém quer” a injeção, garante à AFP Rajesh Kumar, morador de Nuran Khera, de 45 anos.
“Não vou ser vacinado porque tem muitos efeitos colaterais, as pessoas ficam doentes depois de serem vacinadas”, acrescenta.
Em outros estados surgiram histórias de pessoas pulando em rios ou fugindo na mata para evitar as equipes de saúde.
Hom Kumari, profissional da saúde do vilarejo de Bhatau Jamalpur, no estado de Uttar Pradesh, diz que é impossível convencer alguns moradores.
“O que dizer a alguém que diz ‘se eu tiver que viver, farei isso mesmo sem vacina’?”
O coronavírus tem sido um duro golpe para a economia indiana e os moradores estão mais preocupados com as contas, afirma Rajib Dasgupta, especialista em saúde comunitária.
“É extremamente difícil comunicar por que a vacinação é importante”, ressalta.
Alguns especialistas dizem que a Índia deveria aplicar as lições aprendidas com sua campanha de vacinação contra a pólio nos anos 2000. A campanha teve sucesso depois que os líderes comunitários se envolveram para explicar aos pais que a vacinação era segura para seus filhos.
Da mesma forma, líderes religiosos em Uttar Pradesh foram recentemente chamados para encorajar seus seguidores a se vacinarem contra o coronavírus.
Navneet Sing, responsável pela imunização no distrito de Jind, em Haryana, constatou que a comunicação pessoal ajudou quase 70% das pessoas com mais de 45 anos a se vacinarem em Kalwa e nas comunidades vizinhas.
Em Kalwa, a profissional da saúde Sheela Devi conta que ficou nervosa quando seu nome foi colocado na lista de vacinação, mas se sentiu mais calma quando o médico local recebeu uma dose.
Agora vai de porta em porta para convencer as pessoas.
“Estão gradualmente se convencendo de que, mesmo que contraiam o vírus após serem vacinados, não precisarão de hospitalização. Eles podem tomar remédios e se recuperar em casa”, diz Devi à AFP.