O desembargador João Pedro Gebran Neto, relator da operação Lava Jato no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), fundamentou com preceitos legais, precedentes, análise processual e convicções pessoais sua decisão de rejeitar, como regra geral retroativa, a ordem diferenciada para apresentação das alegações finais entre réus delatados e delatores. Seu voto, acompanhado pelos dois outros magistrados da Turma, diverge do Supremo Tribunal Federal, que anulou a condenação do ex-presidente da Petrobras, Aldemir Bendine, com o argumento de que ele teve sua defesa prejudicada porque apresentou suas alegações finais após seu delator.

Ao negar o pedido de nulidade da sentença que condenou em primeira instância o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no caso do sítio de Atibaia, Gebran Neto disse que “não comunga desse entendimento”, já alvo de debates anteriores. Segundo ele, além de não ter base legal, o entendimento não pode ser usado como regra para processos passados.

“Me parece que o que fez o Supremo Tribunal Federal é criar uma norma processual não escrita (…), que só poderia valer com efeito ex nunc, jamais uma norma processual com eficácia retroativa. Fazendo com que todos os juízes do Brasil tivessem que adivinhar que, em determinado momento, seria criado uma nova norma, e que todos os processos que não implicassem essa nova norma retroativamente seriam eivados de nulidade”, afirmou.

A decisão do TRF-4 foi criticada por ministros do Supremo. A defesa de Lula a classificou como uma “afronta” ao Supremo. Para a Oitava Turma, a tese é uma “compreensão inovadora de ordem processual”.

No processo contra Bendine, o plenário do STF acolheu o argumento de que houve prejuízo a Bendine na apresentação de sua defesa final ao mesmo tempo que os réus delatores, e anulou sentença da 13.ª Vara Federal de Curitiba. No processo de Lula, os desembargadores afirmam que não houve prejuízo. “Entendo que o processo está em consonância com o Código de Processo Penal. Os prazos para alegações finais são comuns a todos os réus, não havendo em que se falar em ordem diferenciada de apresentação de alegações finais”, afirmou Gebran Neto ao ler o voto de mais de 350 páginas.

Gebran Neto argumentou que há 24 anos a delação existe, mesmo antes da lei de 2013 que a regulamentou, e “nunca se tratou de ordem preferencial para delatados antes”. Além dos artigos do código, citou voto do ministro Celso de Mello, do STF, que defendeu a “necessidade de preservação dos atos pretéritos”. “Como procedimento processual, está regrado na lei e não cabe ser alterado por interpretação desse tipo. Com efeito o prazo das alegações finais no Código de Processo Penal é comum e a pretensão carece de fundamentação. É nessa linha a minha compreensão pessoal.”

Tese

O relator usou artigos do Código de Processo Penal, decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em especial do ministro Felix Fischer, relator da Lava Jato na corte, e de ministros e ex-ministros do STF, como Cezar Peluso.

O desembargador afirmou que o TRF-4 tem longa fundamentação sobre o tema e citou um julgamento em outro processo da Lava Jato contra o ex-presidente – em que ele é acusado de corrupção e lavagem envolvendo terreno para o Instituto Lula. Houve debate entre os desembargadores e a conclusão de que “não há direito a manifestação por último de réus não colaboradores”.

Para o tribunal e para o relator da Lava Jato no STJ, o argumento de que há prejuízo para o réu delatado, pois o réu delator figuraria uma espécie de assistente de acusação do Ministério Público, não tem fundamento. Gebran Neto destacou ainda a necessidade de comprovação de prejuízo para os réus. “A jurisprudência do Supremo e do STJ exige a demonstração de prejuízo”, afirmou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.