Elevar as taxas de juros para lutar contra a inflação, mas não muito para evitar que a economia fique de joelhos: o dilema enfrentado por todos os bancos centrais do mundo será o grande tema da reunião anual de Jackson Hole, Estados Unidos, na quinta-feira e sexta-feira.

As montanhas de Grand Teton (Wyoming) recebem todos os anos o encontro organizado pelo Federal Reserve (Fed, banco central americano), uma iniciativa criada pelo ex-presidente da instituição Paul Volcker.

O momento mais esperado do encontro internacional será o discurso do presidente do Fed, Jerome Powell, na sexta-feira às 14H00 GMT (11H00 de Brasília).

A presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, não estará presente. Mas Isabel Schnabel, que integra a direção da instituição como representante da Alemanha, participará em um painel no sábado.

Andrew Bailey, presidente do Banco da Inglaterra (BoE), confirmou presença, mas não vai discursar no evento.

“As cartas estão sobre a mesa na área econômica: um inimigo comum que é a inflação, um risco de desacelerar demais a economia. É necessário escolher entre os dois”, resume Gregori Volokhine, gerente de portfólio da Meeschaert Financial Services, à AFP.

“O Fed não pode dizer que precisa escolher (…) entre aumentar o desemprego ou reduzir a inflação, mas esta é a escolha que deve fazer”, acrescenta.

– “Transição” –

A reunião acontecerá no momento em que todos os bancos centrais elevam as taxas de juros para lutar contra a inflação, apesar do risco de a medida afetar a recuperação pós-pandemia.

O aumento das taxas de juros encarece o crédito e, portanto, freia o consumo e o investimento, o que desacelera a economia e a pressão sobre os preços.

O Fed já elevou quatro vezes, desde março, a taxa básica de juros e o mercado questiona apenas a dimensão das próximas altas, consideradas garantidas.

A inflação nos Estados Unidos em ritmo anual foi de 8,5% em julho, depois do resultado de 9,1% em junho, que representou um recorde em 40 anos.

Os investidores aguardam com ansiedade a próxima reunião do banco central americano, nos dias 20 e 21 de setembro. Analistas debatem se o aumento da taxa de juros será de 0,5% ou 0,76%, como nas últimas duas oportunidades.

A taxa básica de juros nos Estados Unidos está na faixa entre 2,25%-2,50%, perto de um nível considerado “neutro” de 2% a 3%, que não estimula nem paralisa a atividade econômica.

Jerome Powell, em seu discurso de sexta-feira, “vai enfatizar sobre a provável transição que acontecerá com a política monetária no futuro. Algo que desejam comunicar é que estão concentrados nos problemas de estabilidade de preços”, destaca Jonathan Millar, economista do Barclays.

– Credibilidade –

“Jackson Hole pode ser muito importante para esclarecer a hipótese de manutenção das taxas elevadas, apesar de uma desaceleração econômica”, disse Mazen Issa, especialista em mercado cambial da TD Securities.

O PIB dos Estados Unidos registrou contração no primeiro e segundo trimestres, o que determina a definição clássica de recessão, embora na maior potência econômica do planeta sejam considerados outros parâmetros para determinar tal estágio da economia, como o nível de emprego.

Estados Unidos registram taxa de 3,5% de desemprego, um mínimo histórico equivalente ao nível de fevereiro de 2020, antes da pandemia. A economia recuperou todos os empregos perdidos durante a pandemia de coronavírus.

Há um ano, na mesma reunião, Powell citou “fatores transitórios” para explicar a inflação e fez um alerta sobre um ajuste prematuro das taxas. Mas desde então, a inflação atingiu os países com força.

Na zona do euro, a alta de preços bateu um recorde, a 8,9% em ritmo anual. A Inglaterra registra uma inflação de dois dígitos, a 10,1%.

“Devemos ter muitas discussões sobre um eventual grande dano à credibilidade” dos bancos centrais, com o erro de trajetória para a inflação, e “o que pode ser feito para corrigir”, afirmou Carola Binder, professora de Economia no Haverford College da Pensilvânia.