A artesã Regina Rustice, de 44 anos, sempre deixava o carro na mesma rua para ir à terapia, que frequenta há seis anos. Em julho passado, saiu da consulta no início da tarde, como de costume. Percebeu, então, que o veículo não estava mais do outro lado da via, no Tatuapé, zona leste da cidade de São Paulo. Hoje, ela usa outros meios para ir até a consulta.

“Foi tudo muito rápido. Falei com o porteiro de um prédio perto, que me mostrou a filmagem, tinha sido há 10 minutos”, conta. “O cara (que furtou o veículo) simplesmente vinha vindo na rua, encostou no meu carro, foi tão rápido que não parecia que ele não era o dono.”

A zona leste é a região que reúne seis dos dez bairros campeões de furtos de veículo na cidade, ranking que é liderado por São Mateus (855), seguido de Sapopemba (718) e Ipiranga (683). Do total, a maioria dos casos (8.836) ocorre de manhã, enquanto a madrugada é o período do dia menos comum (1.951) para furtos do tipo.

A maioria dos veículos é levada de vias públicas, embora a capital também registre casos em estacionamentos pagos e de comércios e serviços, dentre outros. Os dados foram computados pela Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap) a pedido do Grupo Tracker.

Ao menos outros 40.144 automóveis foram furtados na cidade de São Paulo em 2018. O número representa uma redução de 6,7% em 10 anos, quando foram registrados 43.056 casos. Na prática, isso significa que, em média, 109 carros são furtados diariamente na capital – ou seja, um a cada 4,5 minutos.

No caso de Regina, o veículo nunca foi recuperado, mesmo após levar duas multas. Cinco anos antes, Regina havia passado por experiência semelhante na Mooca, também na zona leste. “É uma sensação de insegurança, de não ter confiança de deixar um bem porque pode ser roubado. Na TV, parece muito distante, aí acontece com um conhecido e depois pode ser você.”

Outro caso é o do analista de gestão Pedro de Castro, de 23 anos, cujo veículo que dividia com os pais foi furtado em uma via próxima da Estação Sumaré, na zona oeste, em janeiro de 2018. Ele havia deixado o automóvel por volta das 8h20 e retornou após as 17 horas.

“Cheguei lá e não tinha nada. Fui até ver se estava na rua do lado. Aí voltei e vi que tinha uma borrachinha de um vidro bem no espaço que estava o carro”, relata. “Já fiz bastante (deixar o carro naquele local) e nunca tinha acontecido nada.”

O veículo, um Fox, nunca foi encontrado. “Tive a sorte de não estar ali na hora (do furto). Foi um ponto ‘positivo’. Lembro que no dia eu meio que não sabia se era verdade, só aceitei.”

Já o advogado David Carmona, de 32 anos, conseguiu recuperar o veículo pouco após o furto, que ocorreu na Rua Raul Pompeia, também na zona oeste, em maio. “Deixei por volta das 20h30 na porta do prédio em que morava. Por volta das 21 horas, o porteiro interfonou dizendo que estavam levando o carro. Liguei para o 190 na hora.”

Segundo ele, em alguns minutos, a placa do carro foi identificada em um radar e o criminoso, detido. “Sempre morei por ali e sempre deixei o carro na rua. Sabia que tinha casos, mas achei que nunca iriam levar estando na frente do prédio.”

A experiência da artesã Luana Dorta, de 41 anos, foi mais “traumática”, como define. Ela havia deixado o carro (do modelo Up!) perto de uma unidade de saúde em Perdizes, zona oeste. Era por volta das 9 horas de um dia útil, em março de 2018, quando ela ficou desconfiada e resolveu checar se o automóvel ainda estava no local.

“Quando estava descendo a rua, vi um homem cutucando o vidro do carro com uma bengala. Ele abaixou a bengala e ficou me olhando. Fiquei com medo, eu era uma mulher sozinha. Iria falar o quê? Voltei para o posto e, uma hora depois, o carro não estava mais lá.”

Luana conta que o automóvel chegou a ser multado menos de uma hora depois a caminho de Osasco, na região metropolitana. Mesmo com o reembolso do seguro, a artesã não quis comprar outro veículo e, hoje, se desloca com transporte por aplicativo e metrô.

Bairros

De todos os furtos em 2018 no Estado, 41,46% ocorreram na capital. Como aponta o professor Erivaldo Costa Vieira, do Núcleo de Pesquisa da Fecap, os casos também afetam a população “flutuante”, que mora em outras cidades e trabalha em São Paulo.

O professor ressalta que as vias com mais casos são geralmente as de grande extensão, como a Avenida Sapopemba (que tem cerca de quatro quilômetros). Entre as 18 com mais ocorrências, há algumas de menor porte também, como a Rua Barão do Bananal, na zona oeste, que tem cerca de 1,5 quilômetro.

Um dos motivos para haver menos roubos nas regiões mais próximas do centro é a maior presença de policiamento e segurança privada, afirma o professor Rafael Alcadipani da Silveira, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Sobre furtos, o professor diz que, caso não ocorra mudanças no local, a tendência é continuarem ocorrendo. “Sempre o criminoso vai perceber onde é mais fácil para atuar. Se ele percebe que não muda o contexto de um lugar, vai continuar achando fácil atuar lá.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.