28/09/2011 - 21:00
O primeiro semestre foi difícil para o banco mineiro BMG. O Banco Central (BC) apertou as regras dos empréstimos consignados, sua principal linha de negócios, o que fez o resultado desabar. A última linha do balanço registrou um lucro de R$ 21,3 milhões, queda de 94% ante os R$ 352 milhões de 2010. Não foi a única notícia ruim. Cerca de 90% dos resultados do BMG vêm dos empréstimos para servidores públicos e aposentados do INSS, e a competição está cada vez mais acirrada, com a vinda dos gigantes do sistema financeiro, como Banco do Brasil (BB) e Caixa Econômica Federal. Para enfrentar o cerrado ataque da concorrência, Ricardo Annes Guimarães, presidente do BMG, vai alterar a estratégia. Aficionado por futebol – chegou a presidir o Atlético Mineiro por alguns anos –, Guimarães vai tentar outras táticas ofensivas. “O ganho das operações com o consignado está mais apertado, por isso vamos diversificar nossas operações para reduzir sua participação nos resultados”, disse Guimarães em entrevista exclusiva à DINHEIRO. “Nossa meta para daqui a três anos é que a participação desses empréstimos recue de 90% para 70% do faturamento.”
Ricardo Guimarães, presidente: ”Nossa meta é reduzir a dependência dos créditos consignados,
que hoje respondem por 90% dos negócios”
Reforçar a defesa no consignado e buscar atacar pelas laterais é uma estratégia prudente. Apesar de não ser o produto mais rentável na prateleira dos bancos, os empréstimos consignados têm duas vantagens. A primeira é serem créditos de baixo risco, pois o devedor é o governo, que paga em dia. A segunda é que o cliente do consignado é o que mais interessa às instituições financeiras atualmente. Aposentado ou servidor público, com renda previsível e garantida, esse cliente oferece pouco risco de crédito e, em geral, é um consumidor ávido de capitalização, cartões de crédito e seguros massificados, produtos lucrativos que mantem os clientes fiéis por longos períodos. Nos últimos meses, BB e Caixa têm sido muito ativos. Desde 2008, o Ministério da Previdência Social não publica estatísticas oficiais com a fatia de cada banco no consignado. O BMG afirma ter uma fatia de 18%. Levantamentos informais indicam que a parcela dos grandes nesse negócio cresceu de cerca de 40% para mais de 50% em pouco mais de dois anos, e o movimento deve continuar. “Os bancos pequenos precisam pagar comissões para seus vendedores, ao passo que, no caso dos grandes, esse custo é diluído na rede de agências”, diz um banqueiro concorrente do BMG.
Esses representantes, os chamados “pastinhas”, recebem comissões de 17% do valor total do empréstimo em média. O BMG, que começou a operar nesse negócio em 1998, paga comissões menores, ao redor de 12%, diz Guimarães. “Estabelecemos esses relacionamentos com nossos correspondentes há mais de dez anos”, diz ele. “Essa é uma de nossas vantagens estratégicas.” Quem conhece o mercado concorda. “O BMG é um banco muito bem posicionado e um ótimo operador no consignado”, diz Rafael Guedes, diretor-executivo da agência de classificação de risco Fitch Ratings no Brasil. Mesmo assim, o BMG quer poder contar com outra linha de ataque. Em julho, o banco anunciou a compra de duas instituições financeiras, o banco paulista Schahin e a GE Money, financeira do grupo americano GE, por um valor não revelado. No final de junho, pressionados por empréstimos ruins, representantes do Schahin percorreram o trajeto de quatro quilômetros entre sua sede, no Paraíso, e o escritório do BMG em São Paulo, na região da avenida Paulista, levando uma oferta de venda. As conversas evoluíram rapidamente, tanto na sede do BMG quanto na discreta e suntuosa sede do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), na avenida Faria Lima, zona sul de São Paulo.
Crédito para veículos: banco mineiro prepara retorno a esse mercado usando a rede de distribuição do banco Schahin,
mas a estratégia será mais cautelosa, com prazos menores e redução do percentual do carro a ser financiado
Mantido com recursos oriundos das aplicações de renda fixa, o FGC assumiu, desde o fim dos programas estatais de ajuda aos bancos, o papel de casamenteiro no sistema financeiro, procurando pretendentes para as noivas problemáticas. Foi o fundo que acertou a transferência do combalido PanAmericano para o BTG Pactual, no início do ano, e também foi ele quem costurou o acordo pelo qual o BMG assumiu o Schahin. Para isso, o fundo acertou que a família Guimarães realizasse uma reestruturação societária e capitalizasse o banco em R$ 1,5 bilhão para reforçar o patrimônio. Com cerca de 98% de suas ações pertencentes aos membros da família Guimarães, o BMG montou uma holding com a mesma composição societária para controlar o banco. Guimarães não fornece maiores detalhes, mas sabe-se que estruturas desse tipo facilitam operações de aquisição no futuro. Foi esse o mecanismo usado pelo Itaú para assumir o controle do BankBoston, em 2004. Guimarães se fecha em copas quanto à origem dos recursos para a capitalização do banco. Procurado por DINHEIRO, o FGC não concedeu entrevista. No entanto, executivos que acompanharam as negociações revelam que os controladores entraram com R$ 600 milhões e o fundo colocou R$ 900 milhões.
Esse dinheiro serviu para cobrir as perdas do Schahin, estimadas em R$ 400 milhões, e também para fazer frente a eventuais problemas com as operações do banco paulista, além de reduzir a alavancagem do BMG. Guimarães não confirma os números. “A família optou por se desfazer de outros negócios para injetar recursos no banco”, diz ele, mudando de assunto. Entre os ativos vendidos estão participações de 35% no capital da Magnesita e de 30% na Dufry, empresa que explora as lojas “duty free” em 11 aeroportos no Brasil, entre outras praças. As aquisições reforçaram a rede de distribuição do BMG. Aos 100 pontos de venda originais do banco mineiro somaram-se 54 lojas da GE Money e outras 200 do Schahin. O BMG também esquadrinhou as contas do banco carioca Morada – chegou até a anunciar incorretamente a associação ao mercado –, mas foi surpreendido pela intervenção do BC na pequena instituição especializada em empréstimos imobiliários. Como não conseguiram comprar o banco, os Guimarães mineiramente procuraram os proprietários das lojas que o Morada alugava e ofereceram-se como novos inquilinos.
Todos aceitaram. Rede ampliada, o banco vai lançar novos produtos. Entre eles, um seguro popular em parceria com a seguradora carioca Icatu. Será uma apólice de baixo preço, destinada a ser o “primeiro seguro” de clientes que até então não tinham acesso a essa proteção. “Também vamos lançar cartões de crédito”, diz Guimarães. Outra aposta é no financiamento de veículos, segmento do qual o BMG se retirou em 2008. No entanto, essa volta será feita na retranca. “Em 2008, os bancos financiavam parcelas maiores do valor do automóvel e concediam créditos por prazos de até 60 meses”, diz Guimarães. Quando veio a crise internacional de 2008, os prejuízos foram pesados. Agora, afirma o presidente do BMG, a meta é emprestar por no máximo 36 meses. Seguros, cartões e veículos formam a nova linha de ataque do banco. “O sistema bancário brasileiro está bem, mas alguns dos bancos mais fracos podem apresentar problemas”, diz Guedes, da Fitch – que atribui nota “A” ao BMG, o que representa um bom risco de crédito em comparação com seus pares.