25/02/2022 - 7:24
Com os Estados Unidos como aliado histórico, forças russas com base na vizinha Síria e quase um milhão de cidadãos procedentes da ex-União Soviética, Israel tenta encontrar um difícil equilíbrio após a invasão da Ucrânia.
Em Bat Yam, cidade na periferia de Tel Aviv onde se estabeleceram milhares de judeus russos e ucranianos nos últimos anos, os bombardeios do Exército de Vladimir Putin contra a Ucrânia provocaram uma forte comoção.
Natalia Kogan, de 57 anos, funcionária em um supermercado onde são vendidas cervejas produzidas na Ucrânia e na Rússia – com pais que vivem na Ucrânia -, afirma que ficou “estupefata” com o anúncio dos ataques.
“Falei para minha mãe e meu pai que não se estressem. Acho que não vai durar mais que um dia ou dois, que (a guerra) só vai acontecer entre os militares”, conta Natalia, que diz sentir que está mais segura em Israel, um país que, no entanto, travou no ano passado uma guerra com o movimento islamita Hamas em Gaza.
Max, de 33 anos, natural da Rússia e que imigrou aos oito anos para Israel, afirma “entender” que, aos olhos do presidente Putin, a possível adesão da Ucrânia à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) represente uma “ameaça para a Rússia”.
“Mas isto não justifica uma invasão (…) e o que é mais frustrante é que as pessoas normais sofrem”, lamenta, acrescentando que ele não percebe tensões entre ucranianos e russos em Israel.
O que o Estado hebreu deveria fazer diante da situação?
“Israel tem apenas que retirar (os judeus) e fornecer ajuda médica. Não deve ajudar a Rússia, e sim ajudar os cidadãos ucranianos e, talvez, também conversar com Putin, se ele não se tranquilizar”, continua o jovem pai de família.
– “Laços antigos” –
Na quinta-feira (24), o chefe da diplomacia israelense, Yair Lapid, condenou a invasão russa, avaliando que constitui uma “grave violação da ordem mundial”. Destacou, no entanto, os “laços antigos, profundos e próximos” que unem o Estado hebreu à Rússia e à Ucrânia, principais focos da “Aliá”, a imigração judaica para Israel.
Nos últimos dias, Israel pediu a seus cidadãos que deixassem o país. Ontem, após os primeiros ataques russos, os voos para Tel Aviv foram cancelados, o que forçou milhares de israelenses atualmente na Ucrânia – que é um importante local de peregrinação judaica ortodoxa – a viajarem para países europeus vizinhos e depois voarem para Israel.
“Estamos dispostos a receber milhares de imigrantes judeus da Ucrânia”, declarou a ministra da Imigração, Pnina Tamano-Shata, cujo governo não anunciou sanções contra a Rússia, ao contrário dos Estados Unidos, principal aliado do Estado hebreu.
“Embora Israel tenha que condenar a violação da soberania ucraniana (por parte da Rússia), não podemos ignorar que o Exército russo está na nossa fronteira norte (na Síria). É uma questão de segurança nacional”, explica à AFP Michael Oren, historiador e ex-embaixador de Israel nos Estados Unidos.
Desde 2015, a Rússia tem presença militar na Síria, país vizinho de Israel, para apoiar as forças do presidente Bashar al-Assad.
– “Equilíbrio delicado” –
A intervenção, com bombardeios violentos e destruição em larga escala, mudou o curso da guerra na Síria. Permitiu ao governo de Damasco obter vitórias decisivas e recuperar territórios que havia perdido para rebeldes e jihadistas.
E não é possível esquecer a importante comunidade judaica na Rússia, acrescenta Oren.
“Não podemos voltar a uma situação em que Israel seria privado de contato com eles”, considera.
As relações de Israel com a ex-União Soviética eram “muito ruins”, mas “melhoraram” com a Rússia de Putin, enfatiza Itamar Rabinovich, ex-diplomata israelense que acompanha de perto a política de seu país em relação à Síria, onde operam grupos pró-Irã, inimigo número um do Estado Hebreu.
Nos últimos anos, o Exército israelense multiplicou os ataques aéreos contra os grupos sem que a Rússia, pelo menos oficialmente, tenha impedido.
“A Rússia permite a Israel levar adiante sua guerra contra o Irã sem, no entanto, impedir que o Irã continue com seus objetivos na Síria”, afirma Rabinovich.
“Não queremos colocar em risco este equilíbrio delicado em nosso relacionamento com a Rússia”, conclui.