09/09/2022 - 13:06
Desculpe o atraso, mas hoje não estou nada bem. Atravessei mais uma noite sem dormir direito, com uma insônia terrível que me persegue há meses, devido a esse momento de muitas incertezas que estamos atravessando.”
Com essas palavras, o CEO da filial de uma multinacional que opera no Brasil chegou a uma elegante padaria em Sorocaba, interior paulista, para o café da manhã marcado comigo.
Procurei tranquilizá-lo. Argumentei que ele não é o único a sofrer dessa angústia derivada do momento de incertezas e indefinições, pois vários líderes empresariais que conheço também têm se queixado da situação. E acrescentei que conheço vários executivos que também têm perdido o sono pelo motivo oposto, devido a oportunidades que estão vislumbrando — e não apenas devido a enorme lista de problemas que a todos preocupa.
Como ele demonstrou curiosidade, mencionei algumas empresas que estão crescendo a taxas superiores a dois dígitos a cada trimestre — nos setores de tecnologia, saúde, agro, logística e serviços. E citei exemplos daquelas que mudaram o seu modelo de negócios e se reinventaram.
Como pano de fundo dessa conversa citei o fato de que já coordenei quatro pesquisas sobre o tema “O que Tira o Sono dos CEOs”— a primeira delas promovida pela Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH).
Mais recentemente tenho feito uma enquete informal e perguntado a CEOs, a presidentes de Conselhos de Administração e a vários donos de empresas o que os aflige e quais os seus pesadelos.
Cerca de 20% revelam que o que tira o seu sono são as “dores do crescimento”, pois estão empenhados em aproveitar oportunidades que percebem e sonham em dobrar de tamanho nos próximos três ou quatro anos — por meio do lançamento de novos produtos, da penetração em novos nichos de clientes, uso de novas tecnologias disponíveis e outros fatores que podem servir de alavanca para suas empresas irem para um novo patamar.
Porém, a grande maioria dos executivos, focada no desafio da sobrevivência ou da manutenção do status quo das suas empresas, aponta mais para problemas do que oportunidades. Divido os temas mais recorrentes em dois blocos: os fatores externos oriundos do macro ambiente e aqueles itens intrínsecos à própria dinâmica organizacional.
Dentre os fatores externos, as menções mais recorrentes têm sido:
• Falta de um projeto para o País que sirva de moldura para a estratégia das suas empresas;
• Insegurança jurídica que aumenta o risco dos negócios, devido a seguidas tentativas de enfraquecimento das instituições;
• Infraestrutura deficiente que aumenta os custos de distribuição de produtos;
• Carga tributária que onera os custos e consequentemente os preços, diminuindo a competitividade das empresas;
• A atual elevada taxa de inflação e juros que têm prejudicado a concessão de crédito ao consumidor e, consequentemente, o consumo.
Quanto aos fatores internos, os mais mencionados são:
• Falta de alinhamento mais profundo entre acionistas, conselheiros e dirigentes sobre a estratégia que, muitas vezes, está apenas na cabeça de uns poucos;
• Deficiente execução da estratégia devido à falta de comprometimento dos gestores em transformar planos em realidade;
• Escassez de líderes e gestores, em todos os níveis, capacitados para enfrentar a nova realidade empresarial, sendo muitos ainda apegados ao que deu certo no passado;
• Mudança no comportamento dos consumidores ainda não detectada com a necessária profundidade, fazendo com que as empresas continuem insistindo em vender produtos e serviços que não correspondem mais ao que os clientes agora valorizam de fato;
• Necessidade da transformação digital que muitos pensam ser essencial, mas não sabem como fazer por ser uma questão cultural e não apenas tecnológica;
• Desafio da inovação tão necessária, mas pouco praticada de fato, o que leva negócios tradicionais a serem destruídos da noite para o dia por soluções disruptivas concebidas por startups.
Em adição a esses pontos, vários executivos, em especial os de recursos humanos, têm comentado comigo outra coisa que tem lhes tirado o sono: o mercado de
trabalho em algumas profissões está muito aquecido no pós-pandemia. Isso tem motivado a busca desenfreada por talentos, causando uma bolha salarial crescente, e faz alguns desses profissionais, especialmente os mais jovens, mudarem constantemente de emprego, sem criar uma relação mais longeva com as empresas.
Também tenho percebido nos últimos meses uma preocupação crescente com o processo de sucessão das lideranças, tanto em empresas familiares quanto naquelas já profissionalizadas e, até mesmo, nas multinacionais. Isso tem se revelado pela grande demanda que recebo para projetos de mentoria para possíveis sucessores em cargos de diretoria (C-level).
Voltando ao café da manhã com o CEO, na saída ele me pediu alguns conselhos para melhor enfrentar a situação. Fiquei numa “saia justa”, pois sempre evito sugerir iniciativas sem ter analisado os fatos de forma profunda.
Porém, arrisquei duas opiniões. Uma sobre o problema fisiológico da insônia que ele confessara ao chegar. De forma diplomática, sugeri que marcasse uma consulta com um endocrinologista e que solicitasse um rigoroso checkup, a necessidade da retomada de uma atividade física diária, além de uma alimentação mais saudável.
A outra opinião foi sobre um conjunto de atitudes diferenciadoras de um líder empresarial: o líder eficaz não deve ficar apenas tentando adivinhar o futuro ou se lamentando excessivamente dos problemas circunstanciais. Tenho aprendido na convivência com vários líderes que os mais bem sucedidos buscam construir o futuro e lutam para carimbar o passaporte da sua empresa e da sua vida rumo ao patamar desejado.
O CEO me olhou profundamente nos olhos, agradeceu e nos despedimos, após marcamos um próximo encontro com a sua equipe de diretores.
E você, caro leitor e estimada leitora, o que está tirando o seu sono?
* César Souza é presidente da Empreenda, consultor e palestrante em Estratégia, Liderança, Clientividade e Inovação. Mentor de diversos CEOs e dirigentes do C-Level. Autor de diversos bestsellers, seu próximo livro, “Passaporte para o Futuro” será lançado em novembro pela Editora Record, selo Best Business.