Na noite da terça-feira (14), um dia após a Petrobras divulgar seu balanço do primeiro trimestre, com queda de 38% no lucro líquido, o mercado foi surpreendido pela notícia de que o presidente da companhia, Jean Paul Prates, havia sido demitido do cargo. O comando da estatal passa para Magda Chambriard, que foi diretora-geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) no governo de Dilma Rousseff.

Alvo de fritura interna no governo nos últimos meses, Prates esteve em disputas abertas com os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Silveira (Minas e Energia), que queriam influenciar mais na estatal. O desgaste foi intensificado diante do impasse sobre o pagamento dos dividendos extraordinários aos acionistas, e piorou após Silveira admitir o conflito com Prates, afirmando que não abriria mão de sua autoridade como ministro sobre a Petrobras.

Em abril, a imprensa divulgou que o presidente Lula chegou a convidar o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, para assumir o comando da petrolífera, mas teria sido dissuadido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. Em sua mensagem de despedida aos funcionários da Petrobras, Prates afirmou que sua missão na empresa havia sido “precocemente abreviada, na presença regozijada de Alexandre Silveira e Rui Costa”, disse, na carta. No fato relevante publicado pela companhia, consta também que Prates irá apresentar sua renúncia ao cargo de membro no conselho de administração.

A insatisfação de Lula com Prates era justificada pelo que o petista considerava uma demora na entrega de promessas, pois o presidente exige maior velocidade na execução dos projetos anunciados pela empresa, especialmente em relação à encomenda de navios aos estaleiros brasileiros, para fomentar a indústria naval, e na aceleração dos investimentos em refino de petróleo.

A média de permanência de um presidente na Petrobras é de cerca de um ano e meio. Nos últimos oito anos, foram oito presidentes. Mudanças repentinas apontam que ser sócio da empresa é ser sócio do governo, o que muitas vezes, traz uma dose maior de risco aos acionistas sem a devida compensação financeira.

MERCADO

Como investidores são avessos a mudanças bruscas de rota, imediatamente após o anúncio os recibos das ações da companhia negociados em Nova York (ADRs) passaram a cair 9%. No pregão da B3 da quarta-feira (15), dia seguinte ao anúncio, as ações fecharam em queda de 6% nas ordinárias (PETR3) e 7,9% nas preferenciais (PETR4). O dia depois da queda, no entanto, deu um pouco de alívio. Os papéis da estatal abriram o pregão da B3 em alta, enquanto na NYSE, as ADRs (PBR) abriram o mercado em queda de 0,25%.

O economista Einar Rivero apontou que a estatal perdeu R$ 34 bilhões em valor de mercado, com a queda nos papéis no dia 15, encerrando o pregão valendo R$ 509 bilhões. “Essa perda de valor equivale ao valor de mercado da Hapvida”, afirmou. O temor do mercado, é óbvio, reside na interferência do governo (controlador) nas decisões gerenciais da companhia, conflitante com os minoritários.

O governo quer fomentar setores enquanto os minoritários querem maximizar os lucros. Outros pontos sensíveis são as políticas de preços, dividendos e a influência política na empresa. Este equilíbrio de interesses é que vai ser o maior desafio da próxima presidente.

Enquanto houver indefinições sobre esses fatores, que impactam diretamente na percepção de risco e projeções de rentabilidade, a alta volatilidade deve continuar.

Para o analista da Nova Futura Investimentos, Hayson Silva, a troca no comando abre espaço para especulações. “Enquanto houver indefinições sobre fatores que impactam diretamente na percepção de risco volatilidade [das ações] deve continuar”, disse.

6%
Foi a queda das ações (ON) da Petrobras no dia 15 de maio, após a demissão de Prates

Para o economista e consultor André Perfeito, a impressão que se tem é que a decisão de Lula foi no sentido de forçar a Petrobrás rumo ao investimento, no entanto, apesar da intenção, se a empresa não concluir suas refinarias, no longo prazo a empresa pode ter grandes problemas em seu balanço na rubrica de petróleo e derivados.

A Ativa Investimentos afirmou, em relatório, que se o mercado já tinha dúvidas quanto à execução da atual estratégia de preços durante a gestão Prates, certamente estas dúvidas aumentarão na gestão Chambriard. “Ainda que não acreditamos que a empresa atualizará os termos da sua política atual, não duvidaremos se a Petrobras, definitivamente, caminhar para uma cobrança mais próxima ao seu valor marginal que ao custo de aquisição do cliente”, afirmou.

DIVIDENDOS

Durante a teleconferência de resultados do primeiro trimestre, a diretoria da estatal mostrou que o pagamento do dividendo extraordinário retido em 2023 seria distribuído, o que se discutia era somente quando seria o melhor momento para fazer. Os analistas da Ativa apontaram que este é um tema que pode resultar em grandes mudanças na receptividade das ações.

A política atual de dividendos é “ativada” quando a dívida bruta da empresa está inferior a US$ 65 bilhões. A Ativa informa que como a Petrobras dispõe de um endividamento bruto de US$ 61,8 bilhões, uma simples aquisição (como da Braskem, por exemplo) que eleve esse indicador condicionaria à companhia a realizar apenas o pagamento mínimo de US$ 4 bilhões para anos em que o Petróleo Brent seja superior a US$ 40 o barril. “Em apenas um movimento, a companhia poderia condicionar o pagamento total de proventos futuro à apenas cerca de R$ 1,50 por ação por ano [considerando um câmbio à R$ 5]”, informa.

A Genial Investimentos apontou que até o final de 2024 a companhia petroleira não deverá sofrer fortes guinadas corporativas. Entretanto,ainda há outros fatores de risco relacionados a distribuição de dividendos. A metade não distribuída referente ao resultado de 2023, gera dúvidas no mercado.

Para os anos seguintes a 2025, a equipe da Genial aponta ser importante observar o posicionamento da nova presidente e como ela aborda o assunto Vale lembrar que ela é uma defensora do papel social da Petrobras. “É importante mencionar que maiores investimentos devem, necessariamente, gerar menor fluxo de dividendos tendo em vista a fórmula vigente para distribuição”, diz o relatório.

(Tânia Rêgo/Agência Brasil)

Decisão de Lula pode ter ocorrido para forçar investimentos da Petrobras, mas a alta alavancagem já foi um problema sério da petroleira em outras gestões petistas

Quem é Magda Chambriard?

Em 70 anos de existência da Petrobras, Magda Chambriard será a 43ª presidente da companhia, sendo a segunda mulher a comandar a estatal, depois de Graça Foster. Ela foi indicada pelo presidente Lula para o posto, herdando o desafio de conciliar os interesses do governo sem perder a confiança do mercado financeiro. Será a sétima pessoa a comandar a companhia em cinco anos.

• Chambriard não é nenhuma novata. Servidora de carreira na Petrobras, ela é engenheira, especializada em exploração e produção de petróleo e foi diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), nomeada pela ex-presidente Dilma Rousseff em 2012. Trata-se de um nome técnico, o receito do mercado, no entanto, é o direcionamento político.

Ministro da Casa Civil, Rui Costa (esq.); ex-presidente da Petrobras, Jean Paul Prates (cen.); e ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira: um conflito que não começou agora e não deve terminar com a mudança no comando da estatal (Crédito:Rafa Neddermeyer/Agência Brasil; Tomaz Silva/Agência Brasil; Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil)

• Magda já se colocou a favor da exploração na Margem Equatorial e contra o Imposto Seletivo ao petróleo. “De maneira geral, não possuímos apontamentos quanto ao seu perfil acadêmico e profissional, porém a forma como chega ao poder alimenta preocupações quanto à interferência estatal na forma como a companhia será conduzida”, afirmou o relatório da Ativa Investimentos.

• Caberá à Magda revisitar o plano de investimentos da companhia, que atualmente compreende US$ 102 bilhões até 2028, podendo acelerar projetos como o Comperj, no Rio de Janeiro, e a Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. A expectativa dos analistas é que Chambriard deverá ampliar os valores investidos em outros segmentos, como Renováveis e Refino.

• Em publicações em seu perfil público, defendeu o investimento no segmento de refino e criticou a distribuição de dividendos por parte da Petrobras. Em entrevista à TV Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), concedida em 2021, ela referiu-se à petroleira como uma via de mão dupla. “A sociedade não espera uma retribuição ipsis litteris de tudo o que ela [Petrobras] fez, mas quer ter retorno, sim, do desenvolvimento proporcionado por essa indústria”, disse.