02/10/2024 - 6:00
Diz um ditado que ou você muda pelo amor ou pela dor. Em se tratando de aspectos climáticos, o mundo não mudou pelo amor e agora estamos sentindo as dores dessa decisão. No entanto, um novo elemento pode fazer parte do dito popular: o bolso. Isso porque cresce a cada ano o número de litígios climáticos iniciados ao redor do mundo que buscam, de alguma forma, reparações ou indenizações de empresas e governos por ações relacionadas ao clima. Só em 2023, foram pelo menos 230 novos casos abertos ao redor do mundo, dos quais 55% foram registrados nos Estados Unidos, conforme levantamento do Grantham Research Institute on Climate Change and the Environment, instituto criado pela London School of Economics and Political Science, em 2008.
• Os americanos lideram o ranking dos países com maior número de litígios climáticos documentados, com quase dois terços do total. Dos 2.666 casos existentes no mundo, 1.745 estão nos Estados Unidos.
• Em segundo lugar aparece o Reino Unido, com 139 abertos, dos quais 24 foram iniciados no ano passado.
• Completam o Top 5 dos países com maior número de litígios climáticos do mundo: Austrália (132 no total, 6 em 2023), Brasil (82 no total, 10 em 2023) e Alemanha (60 casos no total, 7 em 2023).
“Podemos ter problemas de investimentos, passando uma imagem que o Brasil não tem políticas ambientais seguras”, diz Marina Freire, sócia do escritório Madrona Fialho AdvogadosOs casos de litígios climáticos em terras nacionais seguem padrões distintos.
• As diferentes instâncias do Ministério Público apresentaram 22 casos.
• Já as entidades da sociedade civil deram início a 21 processos.
• Outros órgãos públicos, como Ibama, Ministério do Meio Ambiente, ajuizaram 15 processos.
• Até mesmo partidos políticos conseguiram espaço nessas causas, tendo aberto 14 casos.
A maioria dos litígios climáticos existentes no País tem como alvo o próprio Estado brasileiro, mas os processos contra empresas privadas têm aumentado sua participação e atualmente já representam quase 40% do total.
Mais da metade das ações judiciais no Brasil estão relacionadas ao uso da terra e questões florestais, com números iguais de processos movidos contra órgãos governamentais por sua inação e contra indivíduos e empresas diretamente responsáveis pelo desmatamento.
• A Amazônia é o foco de 34 dessas ações.
• Segundo o estudo, casos que combinam argumentos sobre clima, proteção florestal e direitos humanos aumentaram no ano passado.
• Um dos exemplos mais notáveis é a ação movida pelo Ministério Público do Pará, que iniciou uma série de processos contra empresas pelo que está sendo denominado de “apropriação de carbono florestal”.
Esse termo descreve um cenário em que o município emitiu um decreto autorizando as operações sem consulta prévia às comunidades afetadas, enquanto as empresas são acusadas de gerar e vender ilegalmente créditos de carbono no mercado voluntário. Essas atividades são consideradas uma violação dos direitos das comunidades tradicionais, destacando a complexa interação entre os esforços de conservação ambiental e a proteção dos direitos das comunidades indígenas e locais.
Segundo a sócia do escritório Madrona Fialho Advogados, Marina Freire, os 82 litígios existentes no Brasil representam apenas uma parte do total de casos investigados, resolvidos administrativamente. “Temos muito mais situações, que são encerradas de forma prematura, sem chegar às vias jurídicas.” Para a especialista, as características naturais e continentais do Brasil deixam o País exposto ao crescente número de litígios climáticos.
Em sua análise, a maioria das ações no Brasil envolve populações indígenas, pequenas empresas, crédito de carbono, empreendimentos em áreas de influência com comunidades indígenas e desmatamento. “Não vi nenhuma ação recente que seja emblemática, de âmbito internacional, mas acredito que uma hora chegará a isso.”
Diante do atual cenário, a pergunta que fica no ar é: quais os impactos que ocupar o posto de quarto país do mundo com maior número de litígios climáticos pode ter para o Brasil? Para Marina, a resposta está em como o País vai lidar com os casos. “Vai depender de qual será a resposta do nosso Judiciário. Podemos mostrar que houve uma resposta efetiva, que foram tomadas precauções a fim da elaboração de novas normas e políticas públicas. Caso contrário, podemos ter problemas de investimentos, passando uma imagem de que não se tem uma política segura no Brasil em relação às questões ambientais e que é arriscado fazer investimento.”