06/04/2022 - 9:07
Quem minimamente tem o trabalho de olhar o balanço dos bancos americanos na última década observa uma evolução assombrosa. Na sua grande maioria, são balanços capitalizados e líquidos, sustentados por modelos de negócio sólidos, focados no cliente e cada vez mais eficientes. Não, os truques dos anos 2000 não têm mais espaço por ali, e a gestão de riscos está a cada dia melhor. Os grandes bancos americanos estão no centro da economia, e o bom analista consegue ver que negociam, a mercado, a uma fração do que deveriam, considerando sua capacidade de geração de lucros. Mesmo assim, há uma parte dos analistas que prefere não enxergar essa realidade, por algum tipo de preconceito em relação ao setor, ou talvez por acreditarem que as ações desses bancos não trazem aquele elemento sedutor das empresas do Vale do Silício.
Por natureza, trata-se de uma indústria regulada. E cíclica: quanto melhor vai a economia, melhor para eles, e vice-versa. São dependentes dos juros: quanto mais baixos, pior, pois não conseguem rentabilizar o capital adequadamente. Tudo isso é verdade. Durante a última década, no entanto, o nível de regulação da indústria talvez só tenha se equiparado ao período que sucedeu a quebra da Bolsa em 1929. O crescimento da economia não foi nada fora do comum: de 2009 até 2019, a média de crescimento anual do PIB americano foi de 2,3%, um número bastante perto do potencial. Além disso, a última década viu as menores taxas de juros da história. Considerando todos esses fatores, como explicar a performance espetacular dessas instituições?
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O que houve foi uma mudança radical dos modelos de negócio. Uns mais à frente que outros, os grandes bancos americanos passaram a colocar no centro da sua estratégia a entrega de bons produtos financeiros aos clientes, de maneira rápida, eficiente e por meio do uso intensivo de tecnologia. Quando comparada à prática de “criar” produtos financeiros através de uma engenharia intrincada que alimentava riscos e inventava retornos, é uma mudança e tanto.
Quem sai na dianteira é o JPMorgan Chase. Sua fortaleza de balanço permitiu que pudesse largar na pole position, e os resultados são evidentes. O JPM entra agora na fase 2 dessa transformação, buscando mais do que entregar bons produtos de maneira eficiente: está na cola das Fintechs. Pretende investir de maneira pesada nessa estratégia, o que significa menores resultados no curto prazo. O mercado vai querer saber de maneira mais detalhada onde o capital está sendo investido, qual é o retorno esperado e em que prazo. Nesse meio tempo, há oportunidades melhores de investimento em bancos que ainda estão a um passo atrás nessa transformação.
Entre eles, a melhor alternativa, a meu ver, é o Citibank. Com bancos de varejo fora dos EUA, o Citi é o banco que tem a maior janela de criação de valor no curto prazo à medida em que desinveste dessas operações e traz o capital de volta para o mercado doméstico. A nova gestão do banco, com Jane Fraser na liderança, parece ter clareza do caminho a percorrer, e administra bem a expectativa do mercado indicando um índice de retorno inferior ao que efetivamente pode entregar. Segue o mantra “underpromise and overdeliver”, ou seja, promete menos e executa mais do que o prometido. A conferir, mas o potencial de surpresas positivas é grande. Em uma fase mais avançada que o Citi está o Bank of America. Com a atividade de varejo concentrada no mercado americano, está extremamente bem-posicionado para tomar vantagem do ciclo de alta de juros por aqui.
Para o mercado, porém, isso tudo parece bobagem. Os bancos americanos, hoje, são uma espécie de “Geni”, personagem da famosa canção de Chico Buarque: só levam pedra. Notícias boas ou ruins, juros subindo ou caindo, economia crescendo ou contraindo, não importa: o que vale é “jogar pedra na Geni”. O Zepellin, símbolo da metáfora que redime a personagem menosprezada, chegará. Quando? Trimestre após trimestre, período em que os bancos americanos continuarão mostrando sua resiliência na geração de lucros. Enquanto isso, maldita Geni. E paciência para o investidor.