11/09/2019 - 8:00
Não há mais como falar de consumo sem falar de tecnologia – aliás poucas coisas hoje escapam desta proposição. Nós, brasileiros, somos os mais ávidos por novas tecnologias, inovação e por consumir toneladas de informação disponibilizadas na rede (mesmo ficando ansiosos com tudo isso). O uso de smartphones disparou e nos colocou como uma das nações mais digitalizadas. Somos prodígios nas redes sociais, mas nos preocupamos muito com a possibilidade de nossos dados serem hackeados. E há razões concretas para essa preocupação. Especialistas concordam que não é uma questão de “se” os sistemas de informação serão atacados, mas “quando” e em “qual” proporção. Ninguém está protegido.
Essas informações foram reforçadas pelo presidente global para consumo e varejo de uma grande consultoria internacional em evento recente. Ele apresentou o resultado de uma ampla pesquisa sobre as profundas mudanças nas motivações, atitudes e expectativas do consumidor nesse século, realizada em oito países, dentre eles o Brasil.
O resultado de cada país retrata, naturalmente, seu momento social, econômico e político, mas seguem muitas tendências globais, dentre elas o protagonismo da internet como fonte de informação, a preocupação crescente com a segurança de dados pessoais, a expectativa por qualidade e conveniência, e experiências mais intuitivas e personalizadas.
Outro aspecto pesquisado foi a confiança nas instituições, que atinge 47%. As menos confiáveis são organizações governamentais e as de propaganda – 37% e 26%, respectivamente. Essa última poderia também ser explicada por uma sociedade cada vez mais letrada na disciplina, que nunca desconfiou tanto da comunicação publicitária. Bancos e empresas de saúde gozam o mais alto nível de confiança, ainda que não seja tão alto assim (aproximadamente 60%). No Brasil, saímos fora da curva, abaixo da média, em instituições governamentais, energia e serviços de utilidade pública. Fácil de entender. E confiamos mais nas empresas de tecnologia que os demais países, talvez porque façamos muito uso delas.
E, resultado dos nossos últimos anos complicados, desenvolvemos uma cultura de barganha, passamos por um down trade, procurando produtos com melhor custo-benefício. Com isso, baixamos nosso padrão de consumo. Também reportamos o mais alto nível de preocupação com a aposentadoria (em termos financeiros). E vemos como principal indulgência na vida, a boa comida, o que é bastante frugal.
Outra perspectiva interessante da apresentação tratou da nova demografia etária do planeta e suas peculiaridades em termos de motivação, atenção, conexão, uso do tempo e gastos. Apesar de os Boomers (pessoas nascidas entre anos 40 e meados dos anos 60) terem acumulado muita riqueza, é a geração seguinte, a X, que deve herdá-la e gastá-la. Estima-se que um trilhão de dólares. Geralmente negligenciada pelas estratégias de marketing, é apelidada de geração-sanduíche ou geração-esquecida. A primeira a cuidar de seus pais e de seus filhos simultaneamente, sofre mais pressões por recursos e tempo. Apesar de terem nascidos antes da internet, são bastante digitalizados. Produtos e serviços devem refletir essa realidade.
Dentro da mesma casa que vive um “X”, há uma grande chance de viver um Millennial (nascido entre 1980 e 1999) e um “Z” (nascido depois de 2000). As nativas digitais cresceram na era da explosão das tecnologias de computação e de comunicação. Para a “Z” tudo ocorre, porém, numa dimensão e velocidade mais acentuadas. Se os Millennials queriam conhecer todas as possibilidades digitais, a geração “Z” chegou para fazer a curadoria, criar, projetar e mixar todas as mídias, conteúdos e experiências. Com baixíssima concentração, demandam que sejam seduzidos em segundos, ou outro estímulo vai atraí-los rapidamente.
Nessa casa hipotética, todos seguem se influenciando mutuamente, diariamente.
Não é fácil para a liderança das organizações capturar as necessidades destes grupos. Especialmente porque, como eu, muitos são da geração X, os imigrantes digitais. Para além das pesquisas e consultorias, que contribuem muito, aqueles que convivem de perto com as três outras gerações que habitam o planeta devem ter maior chance de sucesso.
(*) Cecília Andreucci é conselheira de administração, mercadologista e doutora em comunicação.