A crise da WeWork no Brasil, empresa de escritórios compartilhados com maior área ocupada no país, não é uma crise do setor, segundo especialistas consultados pelo site IstoÉ Dinheiro. A avaliação do mercado é que a necessidade crescente de flexibilidade das companhias em um cenário de incertezas garantirá a demanda deste modelo de negócio, que segue em alta.

“Os escritórios compartilhados sempre foram uma solução muito boa, principalmente para momentos de crise”, diz Giancarlo Nicastro, CEO da SiilA, plataforma de dados que reúne informações e análises sobre o mercado imobiliário. “É uma modelo que já existia há muitos anos e que vem ganhando muita força.”

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Marco Crespo, COO da Woba, empresa de gerenciamento de espaços para escritórios, dá um panorama sobre a vitalidade e crescimento do setor. “A gente tem visto um crescimento de 5% a 7% ao mês. Se você comparar a demanda de agosto com a com o agosto do ano passado, a gente está falando de algo em torno de duas vezes mais”, afirma. Já a área ocupada por estes escritórios cresceu de cerca de 222 mil em 2019 para 256 mil em 2024.

Pandemia impactou setor, mas fortaleceu modelo

Durante os anos de isolamento social, as empresas de coworking tiveram de se adaptar à realidade do home office com negociações com locadores e cortes de custos. Porém, a volta do trabalho presencial desde 2022 favorece justamente a busca por contratos de aluguel mais flexíveis.

Pesquisa elaborada pela Woba aponta que apenas 12% das empresas entrevistadas optam por concentrar a sua estratégia em apenas um escritório. A aceitação de espaços flexíveis foi evidenciada por 28% delas. Já 40% apontaram a flexibilidade contratual como um fator crucial para a escolha do modelo. Responderam clientes da empresa e membros da rede de networking Workplace Club como Samsung, Mercado Livre, Tivit e Yamaha.

O modelo atende também a necessidade de empresas e startups que precisam expandir o número de posições de trabalho muito rapidamente.  “Você consegue alocar 300, 500 pessoas de uma forma rápida e com qualidade”, diz Nicastro.

“O modelo de economia compartilhada, que vem junto com a Uber, é um modelo muito atual”, afirma Fernando Didziakas, sócio diretor da empresa especializada em pesquisa imobiliária corporativa Buildings, acrescentando: “A WeWork tem um papel muito significativo no setor, mas ela não é pioneira no Brasil”.

Setor de coworking recupera força com formato híbrido de trabalho
Setor de coworking recupera força com a volta do trabalho presencial (Crédito:Divulgação / Wework)

As maiores do setor

A WeWork segue a líder do seguimento de escritórios compartilhados no Brasil. Segundo dados da Silla, a empresa administra 153 mil metros quadrados, área superior à soma dos espaços de seus quatro principais concorrentes (Regus, Cubo Coworking, VIP Office e GoWork), que é de em torno de 110 mil.

A Regus é a mais antiga operadora de escritórios compartilhados no país. Originária de Bruxelas e listada na bolsa de valores de Londres, ela abriu sua primeira unidade na América Latina em São Paulo no ano de 1994. Até a chegada da WeWork em 2017, era a empresa com maior área ocupada.

A estratégia da WeWork, no entanto, foi chegar já com aluguel de prédios inteiros. Assim, a empresa já havia superado a Regus em 2019 por ampla margem, de 110.617 m² contra 74.932 m², conforme mostra o gráfico abaixo:

Com a pandemia, a Régus decidiu cortar algumas operações menos lucrativas para manter sua saudabilidade. Entre 2020 e 2024, sua área ocupada passou de 74 mil metros quadrados para cerca de 62 mil. O movimento é visto pelos especialistas como um corte estratégico e bem executado.

Já a WeWork não conseguiu fazer o mesmo, limitada também pelo padrão de seus contratos de aluguel, geralmente firmados com prazos mais longos, de pelo menos 10 anos.

A situação financeira da empresa no Brasil tem preocupado investidores e inquilinos e chama atenção especialmente porque a matriz da WeWork, localizada em Nova Iorque, já entrou com um pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos, aprovado em maio de 2024. Especialistas consultados pelo site IstoÉ Dinheiro acreditam que um processo semelhante pode estar próximo também por aqui.

Procurada, a WeWork reafirmou que desconhece os processos de ação de despejo anunciados por seus credores e diz que “segue operando em sua totalidade em todos os prédios no Brasil”.

Outro grande player em 2019, o k2511, era constituído por um único grande complexo localizado em Curitiba. Durante a pandemia, ele fechou as atividades de coworking e passou a funcionar como um condomínio de escritórios tradicional.

Completando o topo do ranking do mercado pré-pandemia, a Cubo Coworking e a Spaces (filiada a Régus) mantiveram-se estagnadas. A segunda acabou ultrapassada pelo crescimento de dois novos operadores, a Vini Offices e a GoWork.

Setor abrange hoje diversas organizações

A plataforma da Woba busca conectar empresas e os espaços que elas precisam, seja através do modelo compartilhado ou através de unidades próprias. Com seus sistemas, identifica por exemplo se uma empresa estaria melhor em um coworking, ou se, ao contrário, ela precisa de um espaço privativo.

Segundo o COO da empresa, a Woba tem mapeados cerca de 3 mil operadoras de coworking no país, dos mais diversos tamanhos. “A gente tem operadores, por exemplo, que tem 9 metros quadrados de área, e outro tem 15 mil.” Cerca de 2200 dos monitorados, ou 70%, estão na plataforma Woba.

“No começo, era aquela dinâmica: alguém pegou uma casa e aí fez um lugar super descolado, meio cara de agência de propaganda”, diz Crespo. A entrada de grandes empresas no cenário mudou o jogo. “Elas querem um ambiente mais parecido com o que elas teriam, só que com os benefícios da eficiência operacional.”

Didziakas destaca que apesar de existir uma concentração dos escritórios em São Paulo, há unidades espalhadas pelo país todo. “Acho que é um modelo que atende todas as capitais.”