A crescente popularidade da inteligência artificial (IA) ​​generativa deve resultar num aumento acelerado do lixo eletrônico ou e-lixo (e-waste), segundo estudo publicado na revista científica Nature Computational Science nesta segunda-feira (28/10).

Os cientistas responsáveis pelo estudo calcularam que o e-lixo pode atingir um total de 1,2 milhão a 5 milhões de toneladas métricas até 2030, ou mil vezes mais do o total produzido em 2023.

“Descobrimos que o e-lixo gerado pela IA generativa, particularmente grandes modelos de linguagem, pode aumentar drasticamente, com potencial de atingir até 2,5 milhões de toneladas por ano até 2030, se não se adotar nenhuma medida de redução de resíduos”, disse Asaf Tzachor, especialista em desenvolvimento sustentável da Universidade Reichman de Israel e coautor do estudo.

A pesquisa também oferece soluções para reduzir o lixo eletrônico, como estratégias para prolongar, reutilizar e reciclar hardware de IA generativa, que podem reduzir a geração residual entre 16% e 86%.

“Isso representa uma enorme oportunidade para reduzir o fluxo de resíduos, caso essas práticas sejam amplamente adotadas. Fica claro neste estudo que a natureza da crise do e-lixo é global, por isso é importante nos concentrarmos na gestão transfronteiriça do e-lixo”, disse Saurabh Gupta, fundador da Earth5R, uma organização de sustentabilidade com sede na Índia. Ele não estava envolvido no estudo.

O que é e-lixo?

Toda vez que se joga fora um dispositivo eletrônico “desatualizado” ou quebrado, ele passa a ser considerado e-lixo. Podem ser computadores, smartphones, carregadores e cabos, brinquedos eletrônicos, automóveis e sistemas de servidores de grandes dimensões.

O e-lixo representa 70% do total de resíduos tóxicos produzidos em todo o mundo a cada ano, mas apenas 12,5% dele é reciclado. O contador em tempo real no portal de internet The World Counts mostra o quão rápido o e-lixo aumenta em todo o mundo.

“Reduzir o e-lixo é importante, porque o descarte inadequado gera liberação de materiais perigosos, como chumbo e mercúrio, que prejudicam os ecossistemas e a saúde humana”, explica Gupta.

Os pesquisadores se concentraram no e-lixo produzido por algoritmos de IA generativa – os tipos de IA que geram textos, imagens, vídeos ou música a partir de grandes conjuntos de dados.

Estudos anteriores confirmaram a alta demanda de energia da IA. Estimativas do instituto de pesquisas SemiAnalysis sugerem que a IA poderá resultar em centros de dados que utilizam 4,5% da produção global de energia até 2030.

Segundo Tzachor, porém, não está tão claro quanto de e-lixo é produzido por programas de IA generativa, como o ChatGPT, incluindo todos os recursos computacionais necessários ao treinamento e uso de IA nos centros de dados.

Como a IA generativa depende de melhorias rápidas na infraestrutura de hardware e tecnologias de chip, há indícios de que ela gera mais e-lixo à medida que o hardware é atualizado ou substituído. “É muito mais fácil e econômico abordar os desafios do lixo eletrônico impostos pela IA agora, antes que eles cresçam para fora de controle”, alerta Tzachor.

Como calcular o crescimento do e-lixo da IA?

Os pesquisadores criaram um modelo para quantificar a escala do e-lixo nos centros de dados que dão suporte ao uso de modelos de IA generativa, como modelos de linguagem de grande porte (LLMs). Eles concluíram que o e-lixo pode atingir 5 milhões de toneladas por ano num cenário de crescimento acelerado da IA.

Mas, segundo ​Tzachor, essas estimativas são potencialmente modestas, devido à rápida transformação do ambiente de negócios da IA: “Fatores como restrições geopolíticas às importações de semicondutores e a rápida rotatividade de servidores podem intensificar a geração de e-lixo associado à IA generativa.”

Ele observa ainda que o estudo incluiu apenas o e-lixo criado por sistemas de IA generativa, especificamente os grandes modelos de linguagem, e não outras formas de IA.

“O e-lixo do ecossistema de IA mais amplo é significativo. O estudo prevê que esse volume aumentará com a maior utilização da IA, criando um desafio ambiental que reunirá várias formas de inteligência artificial” aponta Gupta.

Necessidade de estratégias globais

O estudo estima que a implementação de estratégias de economia circular pode reduzir a geração de lixo eletrônico em 16% ou até 86%. Essas estratégias visam minimizar o desperdício e aumentar a eficiência do hardware de computadores.

Tzachor enumera três objetivos principais da estratégia: prolongar o uso do hardware para postergar a necessidade de novos equipamentos, reutilizar e remanufaturar componentes e extrair os materiais valiosos durante a reciclagem do hardware.

Gupta diz concordar plenamente com as conclusões do estudo: “A faixa de redução de 16% a 86% reflete o imenso potencial dessas estratégias, especialmente se apoiadas por políticas e amplamente implementadas em diferentes setores e regiões.”

Segundo o especialista, sua organização, a Earth5R, já demonstrou quão eficazes podem ser as estratégias de economia circular: “Através de nossos programas de base e parcerias com empresas, já promovemos esforços locais de coleta e reciclagem de e-lixo que ajudam empresas e consumidores a gerir seus eletrônicos de forma sustentável.”

Gupta enfatiza que o e-lixo é uma crise global requerendo estratégias de gestão equitativas e transfronteiriças para mitigar os danos ambientais e à saúde causados ​​quando países ricos exportam seu lixo eletrônico para regiões de baixa renda.