21/09/2024 - 9:00
O varejo brasileiro passa por uma dificuldade muito grande nos últimos anos. Americanas, Magalu e Casas Bahia sofrem para se reerguer enquanto o país ainda sofre com uma taxa de juros elevada, que tira poder de compra dos brasileiros. Na contramão da dificuldade, a Lojasmel está passando por uma grande mudança na estrutura da empresa para voltar a pisar no acelerador e crescer também no comércio eletrônico.
No início de 2024, Pedro Cruz, o filho dos fundadores da rede Manoel Cruz e Maria Helena Cruz, assumiu como CEO da varejista, enquanto o seu pai assumiu como presidente do Conselho Administrativo.
A rede conta com 55 lojas no estado de São Paulo e 1 em Minas Gerais, sendo uma companhia familiar. Fundada em 1979 no bairro do Jabaquara, zona sul da capital, se tornou uma queridinha dos consumidores ao vender de tudo um pouco: utensílios domésticos, decoração, material escolar, brinquedos, eletrônicos e até doces.
A rede também tem uma peculiaridade em seu faturamento: somente 3% dele vem do e-commerce. Com esses dados na mão, o novo CEO quer que esse número chegue e 10% até o final de 2025.
Depois de um crescimento forte na abertura de novas lojas até 2019, o grupo prevê avançar entre 5% e 6% em 2024, mas sem abrir novas lojas. Após cortar o “mato alto” do negócio, o novo CEO afirmou que um plano estratégico de crescimento deve ser lançado em novembro, mas que o objetivo será chegar a 100 lojas até o final de 2028, focando na cidade de São Paulo.
Para Pedro, o segredo para continuar a crescer é mesclar a mentalidade de uma empresa familiar com processos mais modernos do varejo moderno.
Leia abaixo a entrevista
Como é comandar um negócio de família há tanto tempo?
Pedro: Eu sempre estive muito próximo do negócio. Ia com meu pais durante as minhas férias para a primeira loja da rede, que fica no Jabaquara. Ali o varejo me pegou. Fui estudar nos Estados Unidos para aprender mais sobre negócios e, quando voltei, percebi que a cultura da empresa era muito importante para a companhia. Não só o que estava pregado na parede, mas o que é vivido dentro da empresa. Passei pelo cargo de CFO da empresa até que a gente resolveu fazer algumas mudanças e implementar um conselho administrativo. Meu pai então virou presidente deste conselho e eu, o CEO da empresa.
Como é implementar uma governança moderna em uma empresa familiar?
Pedro: Esse sempre foi um desafio nosso. Ser uma empresa familiar não significa ser bagunçada. Então a gente tem um conselho com sete membros entre os sócios, que são todos da família, e profissionais do mercado. E é um momento muito complicado porque a gente tem o nosso ego, né, mas é saudável ter profissionais do mercado para nos ajudar a tomar decisões. Às vezes a gente está vendo algo tão de dentro que não consegue ver o todo. E a nossa responsabilidade com mais de 1500 colaboradores é enorme, a gente não pode deixar ninguém na mão. Então nós já estamos contando com um CFO que veio do mercado, o Edimilson Aparecido da Costa, que já passou por empresas como Supermercados Lopes, Caedu e Galeazzi e Associados.
Hoje a gente tem uma visão muito clara da importância da governança. Tem empresas que têm uma cultura mais hard, de colocar o lucro acima de tudo. Eu considero isso positivo, claro, uma empresa tem que visar o lucro. Mas a gente tem uma visão diferente de negócio, uma preocupação maior com o bem estar. Só que a gente tem que entender também que um pai muitas vezes é duro com os filhos e é pra isso que a governança serve. Acredito que hoje a gente tenha equilibrado esse branding da empresa, do amor, com uma postura mais firme.
Como você está vendo a realidade do varejo hoje em dia?
Pedro: O varejo vive um momento desafiador. Quando me perguntam sobre a crise nas Americanas e como isso é bom pra nós, já que é uma concorrente, eu sempre falo que a quebra de uma Americanas não é bom pra ninguém. Há diversos impactos negativos no crédito, desestrutura todo o setor de bancos também.
Depois de um crescimento mais robusto até mesmo durante a pandemia, a gente planeja crescer entre 5% e 6% esse ano em 2024 e ainda sem inauguração de novas lojas. Nós temos um planejamento estratégico que deve ser apresentado em novembro, mas deve apontar que até 2028 nós devemos atingir 100 lojas. Então assim que esse planejamento estiver traçado, vamos voltar a abrir novas lojas com o crescimento focado em São Paulo.
A gente também está buscando estruturar esse crescimento e já inauguramos um novo Centro de Distribuição, em Extrema (MG), para dar conta de mais de 150 lojas. Estamos investindo forte em logística para que esse crescimento seja sustentável.
Como vocês acreditam que deva se dar esse crescimento? Investimento próprio, financiamento, aquisições no mercado?
A gente não descarta nada. Em princípio a gente quer focar em crescimento com investimento próprio, mas dependendo do cenário a gente pode analisar outros caminhos. Em 2020 a gente adquiriu a rede Mais Valdir, com nove lojas, e foi uma ótima experiência. Em seis meses todos os sistemas estavam totalmente integrados, e a gente sabe o quanto isso é difícil no varejo.
Qual é a estratégia para o e-commerce e para competir com os marketplaces?
A gente está apostando muito nesse novo Centro de Distribuição para dar uma vazão melhor ao e-commerce. Nossa aposta é também no chamado omnichannel, onde o processo de compra é realizado em conjunto no online e no offline. Nossa aposta é num varejo mais digital do que propriamente e-commerce puro, entender essa jornada como um todo. Hoje o cliente pode não comprar no digital, mas ele vê aquele anúncio e vai procurar o produto na loja física. Nós temos uma parceira com a Uber em que temos motoristas pela cidade de São Paulo e, dependendo da hora em que a compra é feita e o local, o produto chega em duas horas. Hoje o e-commerce é responsável por 3% do faturamento total da loja. Queremos chegar a 10% até o final de 2025.
Claro que também estamos de olho nas tendências dos marketplaces. Hoje a gente já consegue se defender muito melhor desses players, porque o que pega muito é a informalidade. Muitas vezes a venda de produtos sem nota fiscal, então a concorrência acaba sendo desleal demais. Mas a gente costuma sempre olhar pra dentro, pro que a gente pode fazer para oferecer produtos melhores e uma experiência de compra melhor.
Como você analisa as medidas do governo para taxar as compras vindas da China?
Pedro: Essa foi uma demanda do chamado varejo mole, de calçados, têxteis e da confecção, por conta da entrada forte da Shein. Acho que é uma medida justa para trazer um pouco mais de equilíbrio pro setor, porque o consumidor sempre vai acabar preferindo o preço. Acredito que é uma medida justa que protege as empresas não por serem as empresas, mas protege empregos e a mão de obra daqui.
Mas é preciso também dar um outro passo nesse sentido, que é abaixar os impostos pra cadeia como um todo. A gente está vendo o debate da reforma tributária que no fim da linha não vai abaixar os impostos.