22/05/2019 - 17:26
A promotora de Justiça Dora Martin Strilicherk ajuizou ação civil pública na sexta-feira, 17, contra o Estado de São Paulo, o Hospital das Clínicas e o Hospital Santa Marcelina. O Ministério Público paulista contesta na Justiça a “supressão da triagem e classificação de risco da demanda espontânea nas Portas de Urgência/Emergência do Hospital das Clínicas e do Hospital Santa Marcelina”, determinadas pelas unidades de forma administrativa.
À Justiça, a promotora pediu, liminarmente, que as unidades retomem a realização da triagem e da classificação de risco e que o Hospital Santa Marcelina deixe de fechar as portas para o Samu. Segundo Dora Martin Strilicherk, o Hospital das Clínicas suspendeu a triagem em 22 de novembro de 2018.
Na segunda-feira, 20, a juíza Liliane Keyko Hioki, da 1ª Vara da Fazenda Pública, mandou intimar o Estado e os hospitais a se manifestarem sobre o pedido liminar da promotora. A magistrada deu prazo de 72 horas.
Na ação, a promotora afirma ainda que o Santa Marcelina também fechou a porta para SAMU e ambulâncias a cada 3 dias por 72 horas. Na avaliação do Ministério Público, as medidas “impõem risco indiscutível à saúde e à vida dos pacientes, caracterizando omissão de socorro e infração à ética médica”.
“A rede de atendimento de urgência e emergência do SUS na cidade de São Paulo corre sérios riscos de desarticulação, pois as demais Portas Hospitalares podem sentir-se no direito de também fecharem”, afirmou Dora Martin Strilicherk.
Entenda os argumentos da Promotoria
Dora relatou à Justiça que o Hospital das Clínicas “está referenciado na Rede SUS do Estado de São Paulo como Hospital Universitário de alta complexidade e também está habilitado na Rede de Urgência e Emergência (RUE) como Porta Hospitalar de Urgência e Emergência”.
Por isso, afirma a promotora, a unidade recebe “custeios diferenciados, com a obrigação legal de manter a porta de urgência/emergência aberta por 24 horas, todos os dias, atendendo a demanda espontânea e a referenciada mediante acolhimento e classificação de risco”.
A promotora aponta que o fechamento da triagem afronta o Contrato de Convênio firmado com os hospitais e as normas da Rede de Urgência e Emergência. A RUE é uma das redes prioritárias do Ministério da Saúde e é formada pelo Serviço de Atendimento Móvel as Urgência (Samu), pelas Unidades de Pronto Atendimento (Upas) e pelas Portas Hospitalares.
“Não pode se portar como se fosse uma unidade de saúde privada, colocando em risco a vida de pacientes que se dirigem ao Pronto Socorro do Instituto Central. Infelizmente, é exatamente esse o quadro que temos desde a data de 23 de novembro de 2018 e que vem sendo objeto de apuração no Inquérito Civil 708/2018, instaurado nesta Promotoria de Saúde Pública”, narrou.
Segundo a promotora, “o Pronto Socorro do Instituto Central do Hospital das Clínicas não mais atende a demanda espontânea e suspendeu a triagem e classificação de risco dos pacientes” que chegam ao local para atendimento de urgência. Dora Martin Strilicherk afirmou que apenas ambulâncias do SAMU ou encaminhadas por outras unidades referenciadas estão autorizadas a entrar no Pronto Socorro.
O inquérito apontou que “pacientes que chegam ao Pronto Socorro Central de forma independente (demanda espontânea) são orientados por um funcionário da guarita a procurar outras unidades de saúde elencadas num pequeno panfleto”.
De acordo com a investigação, os pacientes são forçados a “buscar atendimento em outro local sem passar por triagem e classificação de risco no Pronto Socorro, que avalie a real gravidade do quadro clínico e a possibilidade, ou não, do paciente, por conta própria, dirigir-se a outro serviço de menor complexidade”.
“Os riscos à saúde/vida dos pacientes tem sido desprezados pelo Conselho Deliberativo e pela Superintendência do HC, que delegam para um vigilante de portaria, sem formação em saúde, a possibilidade de abrir uma “exceção” à determinação do HC de proibir a entrada de pacientes no Pronto Socorro, caso esse mesmo vigilante entenda ser um caso grave, a partir unicamente de sinais exteriores, capazes de serem detectados por uma pessoas leiga e, no mais das vezes, pouco instruída”, afirmou a promotora.
A ação relatou à Justiça que um funcionário da área de saúde do próprio Hospital das Clínicas denunciou a morte de uma paciente. Segundo Dora Martin Strilicherk, a mulher foi impedida de acessar o Pronto Atendimento pelo vigilante da unidade.
“Quando barrada na Porta do Pronto Atendimento de Urgência do HC, com fortes dores no peito e em toda a lateral esquerda do corpo, com intensa transpiração e olhos revirados, deveria ter sido atendida imediatamente, pois o quadro era compatível com infarto do miocárdio e poderia levar a óbito, como de fato a levou”, narrou.
“A morte da paciente chegou ao conhecimento da Promotoria de Justiça por denúncia de funcionário da área de saúde do próprio HC, quando então ouvimos a família e demos sequência às apurações, que redundaram em requisição de Instauração de Inquérito Policial.”
A ação afirma que o Hospital das Clínicas alegou que fechou sua triagem pois é uma unidade de “alta complexidade”. Dora Martin Strilicherk relatou à Justiça que, em abril de 2019, a direção do hospital fechou as Portas do Pronto Socorro e encerrou a triagem sob o argumento de “superlotação e ocupação de leitos além de sua capacidade de instalação”.
Segundo a promotora, a unidade pendurou uma faixa em sua entrada da frente, na qual orienta os pacientes a procurarem outro hospital. “Atenção – Pronto-Socorro SUS 100 Referenciado – Para Atendimento procure uma Unidade Básica de Saúde (UBS) mais próxima de sua casa ou a UPA 26 de Agosto – Itaquera. Atendimento exclusivo trazido por ambulâncias do SAMU, Corpo de Bombeiros e de outros serviços de saúde referenciados”, informou a faixa.
O Ministério Público pediu que a Justiça condene o Estado a monitorar, fiscalizar e tomar as providências legais e administrativas cabíveis para impedir o fechamento das Portas Hospitalares de urgência em unidades hospitalares integrantes da RUE, inclusive com o cancelamento de habilitações e cessação de custeios diferenciados às unidades de saúde que não prestem o serviço nos moldes da pactuação da RUE e contratos de convênio.
COM A PALAVRA, O HOSPITAL DAS CLÍNICAS
O HCFMUSP esclarece que a paciente Elizabeth Aparecida Carvalho Shiba foi atendida no Centro de Atendimento Médico do HCFMUSP, no próprio Instituto Central, seis minutos após a chegada ao hospital, tendo sido atendida por equipe médica multidisciplinar do próprio centro, e também pelo time de resposta rápida, conforme registrado nas câmeras internas. De acordo com a apuração realizada, a paciente recebeu todos os cuidados que a situação exigia, mas não resistiu.
Com a palavra, o Hospital Santa Marcelina
NOTA DE IMPRENSA
O Hospital Santa Marcelina informa que foi notificado e mantém seu atendimento de acordo com a classificação de risco e com atendimento aos casos complexos trazidos por ambulâncias do SAMU, Corpo de Bombeiros e de outros serviços referenciados.
O atendimento de Pronto-Socorro tem o seguinte cenário atual:
Sala de Choque
• 2 leitos – cadastrados pela ANVISA = 8 pacientes internados (sendo 1 entubado e 3 no aguardo de vaga na UTI)
PS Cirúrgico
• 11 leitos – cadastrados pela ANVISA = 35 pacientes internados
PS Clínico
• 18 leitos – cadastrados pela ANVISA = 51 pacientes internados.
A Assessoria de Imprensa do Hospital Santa Marcelina se mantém à disposição para prestar esclarecimentos, porém lamenta que a postura de alguns veículos de imprensa que realizam imagens do Hospital ou entrevistam pessoas em suas dependências internas, sem acionar nosso setor presencialmente.
A Rede de Saúde Santa Marcelina conta com o apoio da mídia para conscientizar a população de que a Atenção Primária (UBS – próxima da residência do usuário), AME, UPA 24h e PA 24h estão disponíveis para atendimento de urgência e emergência para os casos de baixa e média complexidade.
Dados de atendimento do Hospital Santa Marcelina por ano
• 60 mil atendimentos no Pronto-Socorro (de média e alta complexidade);
• 600 mil consultas ambulatoriais;
• 90 mil internações;
• 33 mil cirurgias;
• realização de 4 milhões e 700 mil exames SADT.
COM A PALAVRA, A PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO
A reportagem fez contato com a Procuradoria-Geral do Estado. O espaço está aberto para manifestação.