A Ordem dos Advogados do Brasil no Rio questionou, no Conselho Nacional de Justiça, a atividade do juiz federal Marcelo Bretas a quem atribui o papel de coach. Bretas se notabilizou como o juiz da Operação Lava Jato fluminense, época em que mandou para a cadeia doleiros, empresários e políticos, entre eles o ex-governador do Rio Sérgio Cabral, condenado a mais de 400 anos de prisão por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Segundo a OAB, Bretas “explora sua condição de membro do Poder Judiciário”, destacando sua atuação como juiz da Lava Jato, como uma estratégia para fomentar a venda de seus serviços de coaching nas redes sociais.

Ao Estadão, Bretas rechaçou com veemência a tese de que atua como coach. “O curso em questão é de caráter acadêmico, tendo sido meticulosamente desenvolvido conforme os parâmetros exigidos pelo MEC”, declara o juiz. “(O curso) segue integralmente os Planos Pedagógicos de Curso aprovados pela Faculdade Anhanguera.”

“Trata-se de um curso de extensão universitária”, afirma Marcelo Bretas. Para ele, “a classificação de ‘coaching’ é apenas uma forma de tentar desqualificar o curso universitário oferecido” (leia abaixo a íntegra da nota de Bretas).

A OAB argumenta que a conduta de Bretas é “manifestamente incompatível com os deveres inerentes à magistratura” e configura “flagrante utilização indevida da função jurisdicional para fins eminentemente comerciais e lucrativos”.

A entidade pede a suspensão das redes sociais de Bretas, a abertura de um processo administrativo disciplinar e ainda a imposição de um novo afastamento do juiz – que já é alvo de uma medida semelhante em investigação sobre suposto favorecimento do ex-governador Wilson Witzel nas eleições 2018.

Segundo a OAB, enquanto afastado de suas funções pelo CNJ, Bretas deveria “ter redobrado cuidado no cumprimento dos seus deveres, até mesmo como forma de demonstrar, com o seu comportamento, sua plena disposição em retornar à prática da jurisdição com a honra e a dignidade que se esperam de integrantes do Poder Judiciário”.

Ainda de acordo com a entidade, o juiz tem aumentado sua exposição pública, oferecendo cursos “típicos de atividades de coaching”, anunciado em seus perfis, no X e no Instagram, que acumulam 500 mil seguidores.

A representação da Ordem destaca o curso que o magistrado ministra ininterruptamente, no qual figura como único “professor”. O curso é intitulado “Método o quarto poder” e nele Bretas trata de “comunicação impactante”, “posicionamento firme”, e “construção de autoridade”.

O curso é promovido em um site com o nome do juiz ao custo de 12 parcelas de R$ 249,90 ou R$ 2.497,00 à vista. Ainda há oferta de acesso a uma “comunidade” exclusiva, mediante assinatura anual – paga.

A OAB-RJ invoca um precedente do CNJ que suspendeu as redes sociais de um magistrado do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ/ES) em razão da atuação como coach. O magistrado, Erik Navarro Wolkart, pediu exoneração do cargo após o episódio.

Nesse contexto, a entidade frisa como o curso de Bretas nada tem a ver com o magistério jurídico, sendo direcionado para “médicos, psicólogos, jornalistas, políticos, servidores públicos e líderes sociais”, conforme sua própria apresentação.

A OAB destaca que a oferta de uma comunidade fechada, na qual os participantes aprenderiam “diretamente com um juiz federal”, demonstra o “uso ostensivo da função jurisdicional como elemento central da atratividade e valor agregado à proposta comercial” – ou seja, a figura do magistrado é “explorada como diferencial competitivo”.

COM A PALAVRA, O JUIZ FEDERAL MARCELO BRETAS

“O curso em questão é de caráter acadêmico, tendo sido meticulosamente desenvolvido conforme os parâmetros exigidos pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC). O curso é registrado sob o título Capacitação em posicionamento, comunicação assertiva e argumentação. O Quarto Poder, pela Faculdade Anhanguera, e segue integralmente os Planos Pedagógicos de Curso (PPC) aprovados por essa instituição, assegurando seu foco em capacitar profissionais do Direito e áreas correlatas na construção de habilidades técnicas de argumentação e comunicação. Trata-se de um Curso de Extensão Universitária. A classificação de ‘coaching’ é apenas uma forma de tentar desqualificar o curso universitário oferecido. A rigor, a Corregedoria do CNJ nada deve fazer, pois já existe o procedimento no Tribunal Regional Federal da 2 Regoão sobre o tema, com julgamento na próxima quinta-feira, 6”.