02/07/2017 - 10:13
Gabriel Oliveira estuda para um concurso da Marinha, João Pedro Regazzi foi fazer intercâmbio na Austrália, Vinícius Martins gerencia a retífica de motores da família. Eles passaram no vestibular para cursar Engenharia de Petróleo na Universidade Federal Fluminense (UFF) em 2011, quando ainda se discutia a possibilidade de o País ter um apagão de engenheiros. Cinco anos depois, já formados, o cenário era outro e o mercado de trabalho tinha virado pelo avesso.
“Nas primeiras disciplinas, os professores falavam que todo mundo sairia empregado. Em 2011, teve aquele boom do petróleo. Foi motivador, mas não durou até nos formarmos”, diz Renan Acosta, um dos dois entre 12 colegas do curso que hoje atuam na área como engenheiros. O outro é Arthur Arenari, que conseguiu estágio em uma empresa de medição de poços e foi promovido recentemente a engenheiro.
A maioria procurou outro trabalho ou foi fazer mestrado, conta Aquiles Oliveira. “Eu desisti da carreira. É uma coisa muito instável. Quando começamos o curso, a situação era outra. Da Petrobrás, só vinha notícia boa, mas tudo mudou”, diz ele, que agora tenta uma vaga na Receita Federal. Mesmo com os concursos em uma maré baixa, ele calcula que na área fiscal as oportunidades serão maiores.
O pai e o irmão de Vinicius Fraga, que busca uma colocação na área, são engenheiros há mais tempo, mas a experiência não fez diferença. “Meu pai é concursado, mas meu irmão era contratado em uma empresa onde a maior parte foi demitida, inclusive ele.”
Somada à crise, que travou o andamento de grandes obras de infraestrutura e deixou a Petrobrás no centro dos escândalos recentes de corrupção, a queda do preço do barril do petróleo nos últimos anos atingiu em cheio uma das áreas da engenharia mais promissoras para se conseguir um emprego.
“Há cerca de cinco anos, as empresas iam até a faculdade, faziam palestras de recrutamento e recolhiam os currículos de quem ia se formar. Era bem diferente”, lembra Bruno Coutinho, formado com a turma em 2016 e hoje na área comercial de uma distribuidora de gás.
“Não foi só a área de petróleo e gás. Os engenheiros civis foram os que sentiram de imediato o adiamento ou cancelamento de projetos, mas toda obra tem um mecânico e um eletricista”, diz o presidente da Federação Nacional de Engenheiros, Murilo Pinheiro. “Todas as profissões sofreram nos últimos anos, a perda de vagas na engenharia só nos lembra do quanto a economia está longe do normal.”
Não apagou. Até o primeiro mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, o apagão de engenheiros – em que a baixa oferta de profissionais limitaria o andamento de obras e o crescimento do País – não parecia exagero. Uma reportagem publicada pelo Estado em maio de 2010, por exemplo, contava a história de um jovem de 24 anos que comandava uma equipe de 450 operários na construção de um prédio comercial em São Paulo. Os mais experientes diziam recusar trabalho e os iniciantes recebiam ofertas antes mesmo de formados.
Três anos depois, uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) já apontava que não seria assim por muito tempo. Pelo estudo, o número de engenheiros atuando em suas respectivas áreas de formação precisaria triplicar até 2020 para não comprometer o andamento de projetos, mas apenas num cenário em que a economia crescesse a um ritmo de 4% ao ano. Só que 2013 terminou com crescimento de 2,3% e foi seguido por um ano de estagnação e duas quedas do PIB.
O mercado de trabalho de engenharia tem relação direta com o crescimento do País. Nos anos 1980, por exemplo, quando o Brasil também passava por uma forte crise, um caso sempre lembrado é o de um profissional que, sem conseguir emprego, abriu uma lanchonete na Avenida Paulista, em São Paulo, batizada de O Engenheiro que Virou Suco.
Desde 2014, o número de profissionais de engenharia demitidos é maior que o de contratados, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho. O saldo de vagas fechou 2016 em queda de 20,7 mil.
O professor Emmanuel Paiva de Andrade, também da UFF, avalia que a Operação Lava Jato, embora importante, contribuiu para derrubar o mercado, que levará um tempo para se reerguer. “Era preciso preservar as empresas. A questão nem é tanto o número de jovens que estão cursando engenharia e se sentem frustrados. O problema são os talentos que deixarão de optar pela carreira pela falta de perspectiva. Se o País vai mal, o engenheiro acaba mesmo virando suco.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.